Um povo que pretende ser livre precisa defender princípios, não seus "camaradas" como se fossem membros de uma máfia. A fidelidade deve ser aos valores comuns, não aos aliados, por interesses escusos. Todo tipo de imperialismo deve ser condenado, independentemente de quem é o imperialista. Caso contrário, trata-se de pura hipocrisia. (p. 16)
Martin Luther King tinha um sonho, de viver num país onde seus filhos fossem julgados não pela cor da pele, mas pelo seu caráter. Trata-se da meritocracia no lugar do racismo. O Brasil, a despeito de seus defeitos, tem demonstrado ser capaz de preservar parcialmente esta visão de mundo. Não podemos deixar que alguns poucos militantes organizados destruam isso. (p. 22)
Cada indivíduo possui diversas características que ajudam a identificá-lo, entre elas: crença religiosa, altura, classe social, sexo, visão política, nacionalidade e cor da pele. O coletivista é aquele que seleciona arbitrariamente alguma dessas características e a coloca no topo absoluto da hierarquia de valores. Para o nacionalista, a nacionalidade é a coisa mais relevante do mundo. Para o socialista, a classe é tudo que importa. para o racialista, a "raça" define quem somos. Todos eles ignoram a menor minoria de todas: o indivíduo. (p. 26)
Existem diversas formas de o governo tentar manipular a imprensa. A mais óbvia é através de suas polpudas verbas de propaganda, incluindo as estatais. Num país com enorme presença do governo na economia, este fator merece destaque. O cão não morde a mão que o alimenta. Além disso, o governo decide sobre as concessões, mantendo as empresas como reféns. Essa tem sido a arma preferida do caudilho Chávez. Por fim, num país com excesso de leis e burocracia, onde o custo da legalidade plena é praticamente proibitivo, o governo sempre pode ameaçar as empresas com o achaque dos fiscais. Cristina Kirshner usou essa tática contra o Clarín. (p. 29)
Um dos grandes paradoxos das democracias modernas é a tendência a reclamar do governo ao mesmo tempo que mais responsabilidade é delegada ao poder político.
Característica bastante comum nos debates, muito são aqueles que tentam monopolizar a virtude. Trata-se daquilo que Thomas Sowell chamou de "tirania da visão". A pessoa, imbuída das melhores intenções, acaba rejeitando uma reflexão honesta e imparcial quanto aos melhores meios disponíveis para os fins desejados. (p. 43)
Saber quanto efetivamente pagamos em cada produto deveria ser um direito básico de qualquer um. No Brasil, entretanto, isto não ocorre, pois inúmeros impostos permanecem ocultos no preço final. Existem dezenas de impostos, tributos e taxas no país, que incidem de forma indireta nos produtos. A quem interessa manter o povo na ignorância desses fatos? Claro que apenas os consumidores de impostos se beneficiam, enquanto todos os pagadores de impostos, incluindo os mais pobres, pagam a conta sem saber sua real magnitude. Isto é imoral. (p. 52)
Nem os tucanos nem os petistas fizeram as reformas estruturais (previdenciária, tributária, trabalhista e política). Qual partido terá coragem de lidar com a preocupante realidade do rombo previdenciário, uma verdadeira bomba-relógio que precisa ser desarmada antes que a demografia torne a situação ainda mais explosiva? Que partido vai atacar o manicômio tributário deste país, com dezenas de impostos que incidem em cascata em todos os produtos? Quem cai comprar briga com as máfias sindicais que impedem as urgentes mudanças das leis trabalhistas, que concentram privilégios à custa dos trabalhadores informais e desempregados? Quem vai defender o coto facultativo e distrital, a descentralização do poder, demasiadamente concentrado em Brasília? Quem ousa mexer nos privilégios dos funcionários públicos? (p. 55)
Somos recordistas mundiais em homicídios. Nossas estradas federais são assassinas. O transporte público é caótico. A saúde e a educação públicas são vergonhosas. A impunidade e a morosidade são marcas registradas de nossa Justiça. A corrupção se alastra feito um câncer. A cultura do "jeitinho" tomou conta do país e a ética foi parar no lixo. Nossas instituições republicanas estão ameaçadas. Nossa democracia é vítima do descaso e do escancarado uso da máquina estatal para a compra de votos. O Estado, capturado por um partido, pratica crimes contra o cidadão, como a quebra de sigilo fiscal da Receita. E ainda somos obrigados a trabalhar cinco meses do ano somente para pagar impostos! (p. 68)
O alerta, feito pelos economistas Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart, merece atenção: "Como se demonstrou reiteradamente ao longo do tempo, os governantes dos países emergentes tendem a considerar os surtos favoráveis como tendências duradouras, o que, por seu turno, atiça uma farra de gastos e de empréstimos públicos, que termina em lágrimas". (p. 101)
Esse livro é excelente. Para poder colocar aqui as melhores partes teria que copiar o livro todo!
quarta-feira, 31 de maio de 2017
terça-feira, 30 de maio de 2017
ANALOGIA DAS CAIXAS DE BOMBONS
ANALOGIA DAS CAIXAS DE BOMBONS
Digamos que você esteja precisando dos efeitos do chocolate na sua vida, e você resolve ir ao supermercado para comprar uma caixa de bombons.
Ao chegar no supermercado você percebe que existem caixas
de bombons de várias marcas e com bombons sortidos. Você pega uma caixa da
Lacta e diz:
- Ah! A Lacta tem o Sonho de Valsa, e eu adoro Sonho de
Valsa.
- Ah! Mas a Garoto tem Baton e eu amo o Baton.
E mais a frente:
- Não, mas a Nestlé tem Chokito e eu faço tudo por um
Chokito!
E agora? O que fazer?
Toda caixa de bombons sortidos tem aquele que você adora (são
os primeiros que você devora), tem aqueles que você gosta, tem aqueles que você
suporta (esses são os últimos a serem comidos), e tem aqueles intragáveis (são
os que você coloca num potinho para oferecer às visitas).
O que fazer na situação colocada acima? O ideal seria
você comprar as três caixas de bombons e verificar com calma o conteúdo de cada
uma delas. Depois você pega um recipiente só seu, escolhe os melhores bombons
de cada caixa, e monta a sua própria caixa de bombons. Não importa o que a
Lacta, a Garoto ou a Nestlé queiram empurrar para você, você pode comer só o que você quiser
e descartar o resto.
Do mesmo modo, esse procedimento pode ser aplicado à
nossa vida cotidiana. Frequentemente a sociedade tenta empurrar para você
pacotes fechados de ideologias políticas, religiões, comportamentos, etc.
O partido X é o melhor e você deve replicar suas ideias,
a religião X é a única que te leva para o céu/paraíso, você nasceu homem/mulher
e deve se comportar como tal, as medidas ideais são essas e você deve se
esforçar para alcançá-las, você deve comer mais X e menos Y, você deve se
vestir de modo adequado à sua idade, você deve namorar alguém mais próximo da
sua idade, você deve se casar com alguém da sua classe social, se você casou então
deve ter filhos, seria bom você arrumar um emprego fixo, talvez você devesse
prestar concurso, se você é feminista deve defender a descriminalização do
aborto, se você defende a liberdade deve defender a liberação da maconha, e
assim vai... Existem milhões de exemplos que poderiam ser usados aqui.
Usando a analogia das caixas de bombons, podemos dizer
que o ideal seria conhecer a fundo todas as ideologias, religiões e
comportamentos, adotar o que te agrada neles e descartar o que não te agrada.
Onde está escrito que eu só posso comprar uma caixa de
bombons? Onde está escrito que eu devo comer a caixa de bombons inteira? Tanto
os bombons que eu gosto quanto os que eu não gosto? Onde está escrito que você
deve defender todas as ideias de uma ideologia? Tanto as que você aprova quanto
as que você não aprova? Onde está escrito que você deve seguir todos os
preceitos de uma religião? Onde está escrito que você deve adotar todos os
comportamentos que algum segmento tenta lhe impor?
E se te perguntarem:
- Mas o que você é?
Você responde:
- Eu sou Fulano de Tal, defendo o que
minha experiência demonstrou fazer efeito, sem nunca ter medo de mudar de
ideia.
(A Analogia das caixas de bombons não é ideia minha, somente repliquei aqui com as minhas palavras.)
segunda-feira, 22 de maio de 2017
Conflito de visões : Origens Ideológicas das Lutas Políticas - Thomas Sowell (2011)
Uma visão foi descrita como um "ato cognitivo pré-analítico". É o que percebemos ou sentimos antes de construirmos qualquer raciocínio sistemático que poderia ser chamado de teoria, e muito menos antes de deduzirmos quaisquer consequências específicas como hipóteses que devem ser testadas mediante provas. Uma visão é nossa percepção de como o mundo funciona. (p. 18)
As batalhas políticas diárias são um pot-pourri de interesses específicos, emoções coletivas, conflitos de personalidade, corrupção e vários outros fatores. (p. 21)
Mesmo a pré-história especulativa do homem, como uma criatura selvagem na natureza, difere drasticamente do ser livre, inocente, concebido por Jean-Jacques Rousseaus, e o participante selvagem da guerra sangrenta de um contra todos, concebido por Thomas Hobbes. (p. 23)
Dentro da tradição da visão irrestrita, temos a convicção de que escolhas estúpidas e imorais explicam os males d mundo - e de que as políticas sociais mais sábias ou morais e humanas são a solução. (p. 46)
A visão restrita, pelo contrário, vê os males do mundo como resultado das escolhas restritas e infelizes disponíveis em função das limitações morais e intelectuais inerentes aos seres humanos. Para melhorar esses males e promover o progresso, os indivíduos confiam em características sistêmicas de certos processos sociais, tais como tradições morais, mercado ou famílias. Consideram esses processos mais como evoluídos do que concebidos - e confiam mais nesses padrões gerais de interação humana do que em políticas específicas concebidas para reduzir diretamente certos resultados para determinados indivíduos ou grupos. (p. 46)
Nem todos os penadores sociais se encaixam nessa dicotomia esquemática. John Stuart Mill e Karl Marx, por exemplo, não se encaixam por diversas razões. Outros assumem posições intermediárias entre as duas visões, ou vão de uma para outra. (p. 47)
Apesar dos avisos necessários, continua sendo um fenômeno importante e surpreendente a grande relação entre a maneira como a natureza humana é concebida no início e toda a concepção do conhecimento, moralidade, poder, tempo, racionalidade, guerra, liberdade e lei que compõe uma visão social. (p. 47)
Na visão restrita, qualquer conhecimento próprio do indivíduo é extremamente inadequado para o processo decisório social, e, frequentemente, mesmo para suas próprias decisões pessoais. Uma sociedade complexa e seu progresso são possíveis, portanto, somente por causa de várias organizações sociais que transmitem e coordenam o conhecimento a partir de inúmeros contemporâneos, assim como a partir de um número ainda maior de antepassados. (p. 49)
A visão irrestrita não tinha uma visão tão restrita do conhecimento humano ou de sua aplicação por meio da razão. Foram os modelos da visão irrestrita do século XVIII que criaram "a idade da razão", como ficou expresso naquela época no título do famosos livro de Thomas Paine. (p. 53)
Aqueles que defendem um ato de legislar deliberado por meio do ativismo da justiça não o fazem baseados na existência da maioria democrática, mesmo naquela geração específica, mas com base na existência de um processo intelectual e moralmente superior para o processo decisório. Quando Dworkin rechaçou o processo oposto como uma "fé estúpida", "uma teoria pessimista da natureza humana", "a filosofia curiosa de Edmundo Burke" e "o desenvolvimento caótico e sem escrúpulos da história", foi um prelúdio da afirmação de uma superioridade competente que neutraliza uma maioria democrática de contemporâneos, longe de excluir gerações anteriores. Para Dworkin, "uma sociedade mais igualitária é uma sociedade melhor mesmo quando seus cidadãos preferem a desigualdade". (p. 67)
É compatível com a visão irrestrita promover fins igualitários por meios desiguais, considerando as grandes diferenças entre aqueles que Mill chamou de "os mais sábios e melhores" e aqueles que não alcançaram ainda esse nível intelectual e moral.
No lado oposto, os partidários da visão restrita tendem, em geral, a se preocupar menos com a promoção da igualdade econômica e social e mais com os perigos de uma desigualdade de poder, produzindo uma elite governante articulada composta por racionalistas. (p. 68)
O homem de negócios socialmente responsável deveria, por exemplo, contratar pessoas desprovidas, investir em coisas que parecem mais necessárias para a sociedade do que as que fossem mais lucrativas para a sua empresa, bem como destinar parte da renda a atividades caritativas e culturais em vez de aplicar tudo em ações ou reinvestir em seus próprios negócios.
A visão restrita vê essas coisas como fora da alçada dos homens de negócios, levando em conta as mais amplas ramificações dessas decisões em um processo sistêmico complexo. De acordo com a visão restrita do conhecimento humano, o que cabe ao homem de negócios é a direção de sua firma individual para promover, dento da lei, sua prosperidade. É no efeito sistemático da concorrência, mais do que nas intenções individuais dos homens de negócios, que esta visão confia para produzir benefícios sociais. Segundo Adam Smith, é somente quando o homem de negócios "busca seu próprio ganho" que ele contribui - através do processo de concorrência - na promoção do bem social "mais efetivamente do que quando realmente tem a intenção de promovê-lo". (p. 70)
Os textos escritos pelos partidários da visão restrita têm muitos exemplos de consequências contraproducentes de políticas bem intencionadas. Porém, para os partidários da visão irrestrita, isso significa se ater somente a erros isolados que podem ser corrigidos, a fim de se opor a tendências que são socialmente benéficas como um todo. (p. 70)
Na visão restrita, o dever moral do homem de negócios é a fidelidade aos acionários, que lhe confiaram sua poupança, não a busca sincera do bem público por meio de doações caritativas, investimentos ou decisões relativas a contratações capazes de comprometer essa confiança. De forma semelhante, o dever moral do juiz é executar fielmente a lei que jurou respeitar, não mudar sinceramente aquela lei para produzir resultados melhores de acordo com o que vê. Dentro dessa visão, um dever moral de uma pessoa dotada de conhecimento é promover fielmente o processo intelectual entre seus alunos e leitores, não levá-los a conclusões específicas que ele sinceramente vê como as melhores para a sociedade. (p. 72)
É necessário observar que nenhuma das grandes visões históricas se mostra como 100% irrestrita ou 100% restrita. (p. 74)
Adam Smith considerava inapropriado que jovens gozassem da mesma confiança que os velhos. "Os mais s[abios e experientes são em geral os menos crédulos", disse ele, e isso dependia fundamentalmente do tempo: "Somente a sabedoria adquirida e a experiência podem ensinar a incredulidade, e muito frequentemente a ensinam o bastante". (p. 76)
A arrogância e o exibicionismo de intelectuais foram, do mesmo modo, temas recorrentes na obra de Burke - assim como os perigos que esses intelectuais representavam para a sociedade. Ele falou de suas "grandes teorias" para as quais teriam de se curvar o céu e a terra. Hobbes também via aqueles que "se veem como mais sábios e mais capazes de governar" como fontes de distração e de guerra civil. Da mesma forma, Hamilton via os intelectuais como perigosos, por causa de sua tendência de seguir "os fantasmas traiçoeiros de um espírito de inovação sempre sedento e nunca satisfeito". (p. 80)
Contudo, para os adeptos da visão irrestrita, os intelectuais são "precursores para seus pares na descoberta da verdade", segundo Godwin. (p. 81)
A visão restrita não é uma visão estática do processo social, tampouco uma visão de que o status quo deveria ser alterado. Pelo contrário, seu princípio central é a evolução. (p. 86)
Na visão restrita da natureza humana, esse tipo de desenvolvimento não tem probabilidade de se tornar geral, de tal forma que a injustiça de pagar a indivíduos recompensas imerecidas deve ser compensada pela injustiça de tirar da sociedade benefícios existentes, não pagando o suficiente para oferecer incentivos para sua produção e plena utilização. (p. 105)
Na visão irrestrita, a própria natureza humana é uma variável, e, de fato, a variável fundamental a ser mudada. (p. 106)
Quando há pessoas que vivem abaixo de algum nível econômico definido como pobreza, os adeptos da visão irrestrita tendem a querer subsidiá-los de alguma forma para produzir diretamente um resultado mais desejável na forma de um padrão de vida mais elevado. Os partidários da visão restrita voltam-se para incentivos de processo, criados por esses planos e suas consequências no comportamento futuro, não somente entre esses beneficiários específicos, mas também em relação a outros que podem se tornar menos cuidadosos quando se trata de evitar o desemprego, a gravidez em adolescentes ou outros fatores vistos como geradores da incidência geral de pobreza. (p. 113)
Essas mudanças podem ser repentinas, em que um evento em particular reorienta todo o pensamento de alguém, ou a mudança pode ser análoga à água que desgasta a pedra, de forma que uma visão imperceptivelmente desaparece, para ser substituída por um conjunto de mudanças dos pressupostos inerentes sobre o homem e o mundo. Esse segundo tipo de mudança pode não deixar um registro claro de quando ou como aconteceu, talvez nem uma consciência nas pessoas envolvidas, a não ser saber que as coisas não são mais vistas da mesma forma que já foram.
Algumas mudanças de visões tendem a ser associadas à idade. O clichê dos radicais aos vinte anos, que se tornam conservadores aos quarenta, data de muitas gerações. (p. 115)
O melhor tipo de mundo para o homem tal como é concebido por uma visão é desastroso para o homem segundo a concepção da outra visão. Os partidários das duas visões estão, portanto, predestinados a serem adversários em uma questão após a outra. (p. 119)
Nas duas visões, o ser hipotético define princípios sociais, mas o locus de controle continua a ser pessoas reais operando coletivamente por meio de representantes, segundo Rawls, e individualmente, de acordo com Smith. Uma estrutura social é um produto coletivo, tanto na visão restrita quanto na irrestrita, mas o exercício de controle contínuo é o que os separa dentro do autointeresse individual dos tomadores de decisão da visão restrita e os decisores representantes para a coletividade da visão irrestrita. (p. 124)
Uma determinada visão pode encaixar-se em qualquer ponto no continuum entre as visões restritas e irrestritas. Também há a possibilidade de combinação de elementos das duas visões de forma tanto consistente quanto inconsistente. O marxismo e o utilitarismo são exemplos clássicos de visões híbridas, embora de formas diferentes. (p. 125)
A teoria marxista da história é essencialmente uma visão restrita, com restrições cada vez menores ao longo dos séculos, terminando no mundo irrestrito do comunismo. (p. 125)
Nas palavras de Engels, "cada desejo individual é obstruído por todos os outros e o que emerge é algo que ninguém quis". (p. 127)
Bentham rejeitava a tomada de decisão na economia por representantes e dizia que um adulto livre e racional deveria ter a liberdade de fazer qualquer negociação financeira não fraudulenta de sua escolha. (p. 131)
O que está no âmago da diferença entre elas é saber se as capacidades e o potencial humanos permitem que decisões sociais sejam tomadas coletivamente através da racionalidade articulada de representantes, para produzir os resultados sociais específicos desejados. A questão crucial é, afinal, não o que é especificamente desejado (uma questão de premissas de valor), mas o que de fato pode ser alcançado (uma questão factual e de causa e efeito), embora, em termos práticos, objetivos considerados inalcançáveis sejam rejeitados, mesmo sendo reconhecidos como moralmente superiores em termos abstratos. (p. 135)
O fascismo apropriou-se de alguns aspectos simbólicos da visão restrita, sem os processos sistêmicos que lhe deram sentido. Foi uma visão irrestrita de governança que atribuiu a seus líderes uma abrangência de conhecimento e dedicação ao bem comum inteiramente incompatível com a visão cujos símbolos evocava.
Adeptos tanto da visão restrita quanto da irrestrita veem o fascismo como a extensão lógica da visão do adversário. Para os que estão na esquerda política, o fascismo é "a extrema direita". Inversamente, para Hayek, o "nacional socialismo" (nazismo) de Hitler foi de fato socialista em seu conceito e execução. (p. 137)
Segundo Condorcet, "uma verdadeira igualdade" requer que "mesmo as diferenças naturais entre homens sejam mitigadas" pela política social. Sem probabilidades iguais de alcançar determinados resultados, a igualdade formal era inadequada - quando não hipócrita - ,segundo a visão irrestrita. George Bernard Shaw, por exemplo, ridicularizou a igualdade formal de oportunidades: "Dê a seu filho uma caneta tinteiro e um punhado de papel, diga-lhe que agora ele tem uma oportunidade igual à minha de escrever peças e veja o que ele lhe dirá!". (p. 146)
Isso não queria apenas dizer que alguns têm pouco enquanto outros têm muito. Causa e efeito estão presentes: alguns têm pouco porque outros têm muito, segundo esse raciocínio que durante séculos fez parte da visão irrestrita. (p. 148)
A consciência sobre as desigualdades e a repulsa em relação a elas não se restringiam aos adeptos da visão irrestrita. Reações semelhantes têm sido comuns desde Adam Smith no século XVIII a Milton Friedman no século XX. (p. 149)
Na visão restrita de Friedman e de outros, acreditava-se que as situações de "exploração" podiam ser eliminadas de forma mais efetiva por características sistêmicas de uma economia competitiva do que por intervenção de líderes políticos em processos econômicos complexos que não podem compreender. O perigo não estava comente nas consequências adversas de sua intervenção na economia, porém mais nas horríveis consequências de uma concentração tão grande do poder político. Resumindo, as tentativas de igualar os resultados econômicos levam a uma maior - e mais perigosa - desigualdade do poder político. Esse foi o tema central de O Caminho da Servidão de Hayek, em que o objetivo de combinar simultaneamente liberdade e igualdade de resultados no socialismo democrático foi declarado como "inalcançável" enquanto resultado, mas perigoso enquanto um processo de mudança rumo ao despotismo.
Socialistas democratas não foram acusados de conspirar para instaurar um despotismo; eram, na verdade, considerados por Hayek indivíduos genuinamente humanos sem a "crueldade" necessária para atingir seus objetivos sociais, mas também eram vistos por ele como pavimentadores do caminho para outros - incluindo fascistas e comunistas - que concluiriam a destruição da liberdade depois de minar irremediavelmente os princípios de igualdade perante a lei e as limitações no poder político na busca da "ilusão de justiça social". (p. 152)
Hayek questionou "se é moral que homens se submetam ao poder da direção que teria de ser exercida para que os benefícios provenientes de indivíduos fossem significativamente descritos como justos ou injustos". (p. 153)
No mundo do século XVIII, em que a maior parte das pessoas era composta de camponeses, Godwin declarou que "o camponês passa pela vida, com algo da insensibilidade desprezível de uma ostra". Rousseau comparava as massas a "um inválido estúpido, pusilânime". Segundo Condorcet, a "raça humana ainda revolta o filósofo que contempla sua história". No século XX, George Bernard Shaw incluía a classe operária entre as pessoas "detestáveis" que "não têm o direito de viver". Ele dizia, ainda: "Eu ficaria desesperado se não soubesse que eles vão todos morrer logo, e não há necessidade alguma de que sejam substituídos por pessoas como eles".
Embora a visão irrestrita tenha caracterizado o igualitarismo como uma convicção de que as pessoas deveriam dividir de forma mais igual os benefícios materiais e de outros tipos da sociedade, ela tente a ver as capacidades existentes das pessoas como muito mais desiguais do que a visão restrita. Entre os economistas contemporâneos que propõem caminhos para países do Terceiro Mundo para sair da pobreza, aqueles que representam uma visão restrita (P. T. Bauer e T. W. Schultz, por exemplo) descrevem as massas de camponeses do Terceiro Mundo como um depósito de habilidades valiosas e capazes de adaptações significativas para mudar condições econômicas, contanto que as elites permitam que concorram no mercado, enquanto aqueles que são politicamente mais de esquerda, como Gunnar Myrdal, descrevem as massas de camponeses como extremamente atrasadas e redimíveis somente por meio dos esforços comprometidos da elite instruída. (p. 161)
Não é sobre o nível de igualdade que as duas visões discordam, mas sobre o que deve ser igualado. Na visão restrita, é o julgamento que deve ser exercido de forma igual e individual tanto quanto possível, sob a influência das tradições e dos valores provenientes da experiência de muitos, amplamente compartilhada, mais do que da articulação especial de poucos. Na visão irrestrita, são as condições materiais da vida que devem ser igualados sob a influência ou poder daqueles que têm as condições intelectuais e morais necessárias para fazer que o bem-estar de outros se torne sua preocupação específica. (p. 164)
Para os adeptos da visão restrita, as pessoas cometem crimes porque são humanas - porque colocam seus próprios interesses ou egos acima dos interesses, sentimentos ou vidas de outros. Partidários da visão restrita põem ênfase em estratagemas sociais para evitar o crime ou castigo, ou seja, para desencorajá-los. Mas para o partidário da visão irrestrita é difícil entender como alguém cometeria um crime terrível sem que houvesse uma causa específica, ainda que fosse a cegueira. (p. 171)
Enquanto Smith via a imposição de uma punição como uma tarefa dolorosa, adeptos da visão irrestrita viam essa questão como uma indulgência desnecessária na vingança, "um retrocesso embrutecedor para todo o horror da desumanidade do homem de tempos remotos". Com essa visão, o criminoso é visto como uma vítima - uma "pobre vítima", segundo palavras de Godwin - primeiramente, das circunstâncias especiais que provocaram o crime, e depois, de pessoas com sede de castigo. (p. 174)
O individualismo adquire significados totalmente diferentes nas duas visões. Na visão restrita, o individualismo significa deixar o indivíduo livre para escolher entre as oportunidades, recompensas sistematicamente geradas, e castigos provenientes de outros indivíduos também livres, sem se submeter a conclusões articuladas impostas pelo poder de entidades organizadoras como o governo, sindicatos ou cartéis. Todavia, na visão irrestrita, o individualismo refere-se ao (1) direito de indivíduos comuns "participarem" das decisões articuladas de entidades coletivas e ao (2) direito daqueles com a sabedoria e a virtude necessárias de terem alguma imunidade em relação a restrições sociais sistêmicas ou organizadas. (p. 178)
Não costuma surpreender dizer que as razões pelas quais o governo exerce o poder na economia também diferem nas duas visões. Na visão irrestrita, é uma questão de intenção, enquanto para a visão restrita, é uma questão de incentivos. A intenção do governo de proteger interesses públicos obriga-o a interferir na economia para desfazer o mal feito pelo poder econômico privado, de acordo com a visão irrestrita. Entretanto, o incentivo inerente ao governo no sentido de aumentar seu próprio poder leva-o a interferir frequentemente de forma desnecessária e maléfica, segundo a visão restrita. (p. 181)
Na visão irrestrita, para a qual os resultados e não os processos são fundamentais, se o comportamento escolhido por A mudar o comportamento de B, então A forçou B a se comportar de determinada forma. Por exemplo, segundo Tribe, se o governo se recusar a pagar abortos de mulheres indigentes, então ele provoca "partos forçados", fazendo, na verdade, com que "mulheres (pelo menos mulheres pobres) sejam incubadoras involuntárias", portanto, "negando às mulheres o poder sobre seu próprio corpo e futuro". (p. 194)
Os benefícios fundamentais dos direitos de propriedade foram concebidos como sociais, permitindo um processo econômico com maior eficiência, um processo social com menos discórdia e um processo político com mais poder e influência difusos do que o possível controle político subcentralizado da economia. (p. 214)
Independentemente de seus mecanismos ou detalhes, a justiça social tem sido o tema dominante da visão irrestrita, de Godwin a Rawls. Como outras formas de justiça, ela é concebida mais como um resultado do que como um processo. Porém, enquanto o imperativo da justiça social permeia a visão irrestrita, ele é praticamente inexistente na visão restrita. Pensadores sociais na tradição da visão restrita consideram seus aspectos humanos, assim como questões de eficácia, mas isso não implica que um resultado de distribuição de renda seja mais justo do que outro. F.A.Hayek é um dos poucos escritores da visão restrita que discute a justiça social - e ele a caracteriza como "absurda", uma "miragem", "uma invocação vazia", "uma superstição quase religiosa" e um conceito de que "não pertence à categoria do erro, mas à da estupidez". Outros contemporâneos na tradição da visão restrita - Milton Friedman e Richard Posner, por exemplo - não se incomodam em discuti-la, ainda que seja como algo a ser refutado.
O conceito de justiça social, portanto, representa os extremos do conflito de visões - uma ideia da maior importância para uma das visões e abaixo da crítica para a outra. (p. 221)
O que distingue a visão irrestrita não é o fato de prescrever preocupação humana em relação aos pobres, mas de ver as transferências de benefícios materiais ao menos afortunados não simplesmente uma questão de humanidade, mas, sobretudo, como uma questão de justiça. (p. 222)
Fundamentalmente para o conceito de justiça social é a noção de que indivíduos têm direito a alguma parte da riqueza produzida por uma sociedade simplesmente por serem membros daquela sociedade, independentemente de quaisquer contribuições individuais feitas ou não para a produção de tal riqueza. (p. 222)
Segundo Godwin: "O efeito produzido por essa doutrina condescendente é que a satisfação de nossos desejos fica à disposição de uns poucos, permitindo-lhes fazer demonstração de generosidade com o que de fato não lhes pertence, bem como comprar a submissão dos pobres mediante o pagamento de uma dívida". (p. 223)
Hayek via alguns defensores da justiça social como cinicamente cientes de participarem da concentração de poder; via, contudo, perigo maior naqueles que sinceramente promoviam o conceito com um fervor que inconscientemente prepara o caminho para outros - totalitaristas - intervirem depois da ruína de barreiras ideológicas, políticas e legais ao poder do governo, tornando sua tarefa fácil. Ele via o nazismo dessa forma, como "a culminância de uma longa evolução de pensamento" na Alemanha promovida por socialistas e outros que tinham objetivos muito diferentes dos nazistas, mas que fomentaram a erosão do respeito por regras legais a favor de imperativos de resultados sociais específicos.
O comunismo também foi visto por Hayek como um beneficiário residual da maneira de pensar promovida por pessoas que podem não ter o desejo de ver o comunismo triunfar. Segundo Hayek, a "justiça distributiva" é inerentemente "irreconciliável com o princípio e direito", e o ideal de um governo de leis e não de homens é tudo o que separa uma sociedade livre e o totalitarismo. Ele cita um escritor soviético que declarou que o "comunismo significa não a vitória da lei socialista, mas a vitória do socialismo sobre qualquer lei". Para Hayek, isso é o que a justiça social como objetivo ignorado afinal significa - uma alternativa para a justiça meramente "formal" como regras impessoais de um processo. (p. 228)
Muito do que a visão irrestrita vê como moralmente necessário a ser feito, a visão restrita vê como impossível ao homem fazer. (p. 231)
Um exemplo desse fenômeno é a declaração frequentemente repetida de que índices mais altos de lares desfeitos e de gravidez na adolescência entre os norte-americanos negros eram devidos ao "legado da escravidão". Somente depois de décadas de ampla repetição dessa afirmação foi feito um estudo abrangente factual, no qual se mostrou que lares desfeitos e gravidez na adolescência era de longe menos comuns entre os negros submetidos à escravidão e as gerações que vieram depois da emancipação do que as de hoje. Uma vez mais a questão não é que uma determinada conclusão estava equivocada, mas que uma afirmação ampla e sem fundamento não foi contestada ao longo de muitos anos porque era adequada para determinada visão. A capacidade de sustentar asserções sem evidências é outro sinal da força e persistência das visões. (p. 244)
As duas visões devem omitir coisas que existem na realidade, e que a maioria dos defensores dessas visões admitiria existir na realidade, por mais que discordassem sobre a prevalência ou o efeito dos fatores omitidos. (p. 245)
A crescente complexidade de teorias geralmente reflete, em parte, as crescentes dificuldades de defendê-las em suas formas mais puras. Dados empíricos florescentes, e formas ainda mais sofisticadas de analisá-los, podem não conseguir dar um único golpe fatal a qualquer uma das grandes visões contrárias que dominaram os dois últimos séculos. Porém tem havido alguns recuos estratégicos importantes dos dois lados. Nenhuma das visões pode manter com segurança o ar de verdade irrefutável que alguns de seus partidários do século XVIII tinham. (p. 247)
Valores são vitais. Mas a questão de que tratamos aqui é se antecedem ou seguem as visões. A conclusão de que provavelmente decorrem de visões mais do que as visões resultam deles não é simplesmente a conclusão desta análise em particular, mas é, ainda, demonstrada pelo comportamento real daqueles que têm o poder de controlar ideias por meio da sociedade, quer essas autoridades sejam seculares ou religiosas. (p. 251)
Adeptos da visão restrita e da irrestrita reconheceram há muito tempo que (...) o que é dito nessas lutas políticas não tem necessariamente ligação com a verdade, ou mesmo com o que qualquer um acredita ser a verdade. (p. 252)
Como alguns dos conceitos-chave usados pelos dois lados foram definidos originalmente nos termos da visão restrita, os adeptos da visão irrestrita tiveram que diferenciar seus conceitos como "verdadeira" liberdade, ou "verdadeira" igualdade, por exemplo, em oposição simplesmente a liberdade "formal" ou igualdade "formal". Entretanto, a ascendência posterior da visão irrestrita obrigou os adeptos da visão restrita a ter uma postura defensiva, na qual tentavam estabelecer as definições mais formais, restritas desses termos como características de processo. (p. 259)
As batalhas políticas diárias são um pot-pourri de interesses específicos, emoções coletivas, conflitos de personalidade, corrupção e vários outros fatores. (p. 21)
Mesmo a pré-história especulativa do homem, como uma criatura selvagem na natureza, difere drasticamente do ser livre, inocente, concebido por Jean-Jacques Rousseaus, e o participante selvagem da guerra sangrenta de um contra todos, concebido por Thomas Hobbes. (p. 23)
Dentro da tradição da visão irrestrita, temos a convicção de que escolhas estúpidas e imorais explicam os males d mundo - e de que as políticas sociais mais sábias ou morais e humanas são a solução. (p. 46)
A visão restrita, pelo contrário, vê os males do mundo como resultado das escolhas restritas e infelizes disponíveis em função das limitações morais e intelectuais inerentes aos seres humanos. Para melhorar esses males e promover o progresso, os indivíduos confiam em características sistêmicas de certos processos sociais, tais como tradições morais, mercado ou famílias. Consideram esses processos mais como evoluídos do que concebidos - e confiam mais nesses padrões gerais de interação humana do que em políticas específicas concebidas para reduzir diretamente certos resultados para determinados indivíduos ou grupos. (p. 46)
Nem todos os penadores sociais se encaixam nessa dicotomia esquemática. John Stuart Mill e Karl Marx, por exemplo, não se encaixam por diversas razões. Outros assumem posições intermediárias entre as duas visões, ou vão de uma para outra. (p. 47)
Apesar dos avisos necessários, continua sendo um fenômeno importante e surpreendente a grande relação entre a maneira como a natureza humana é concebida no início e toda a concepção do conhecimento, moralidade, poder, tempo, racionalidade, guerra, liberdade e lei que compõe uma visão social. (p. 47)
Na visão restrita, qualquer conhecimento próprio do indivíduo é extremamente inadequado para o processo decisório social, e, frequentemente, mesmo para suas próprias decisões pessoais. Uma sociedade complexa e seu progresso são possíveis, portanto, somente por causa de várias organizações sociais que transmitem e coordenam o conhecimento a partir de inúmeros contemporâneos, assim como a partir de um número ainda maior de antepassados. (p. 49)
A visão irrestrita não tinha uma visão tão restrita do conhecimento humano ou de sua aplicação por meio da razão. Foram os modelos da visão irrestrita do século XVIII que criaram "a idade da razão", como ficou expresso naquela época no título do famosos livro de Thomas Paine. (p. 53)
Aqueles que defendem um ato de legislar deliberado por meio do ativismo da justiça não o fazem baseados na existência da maioria democrática, mesmo naquela geração específica, mas com base na existência de um processo intelectual e moralmente superior para o processo decisório. Quando Dworkin rechaçou o processo oposto como uma "fé estúpida", "uma teoria pessimista da natureza humana", "a filosofia curiosa de Edmundo Burke" e "o desenvolvimento caótico e sem escrúpulos da história", foi um prelúdio da afirmação de uma superioridade competente que neutraliza uma maioria democrática de contemporâneos, longe de excluir gerações anteriores. Para Dworkin, "uma sociedade mais igualitária é uma sociedade melhor mesmo quando seus cidadãos preferem a desigualdade". (p. 67)
É compatível com a visão irrestrita promover fins igualitários por meios desiguais, considerando as grandes diferenças entre aqueles que Mill chamou de "os mais sábios e melhores" e aqueles que não alcançaram ainda esse nível intelectual e moral.
No lado oposto, os partidários da visão restrita tendem, em geral, a se preocupar menos com a promoção da igualdade econômica e social e mais com os perigos de uma desigualdade de poder, produzindo uma elite governante articulada composta por racionalistas. (p. 68)
O homem de negócios socialmente responsável deveria, por exemplo, contratar pessoas desprovidas, investir em coisas que parecem mais necessárias para a sociedade do que as que fossem mais lucrativas para a sua empresa, bem como destinar parte da renda a atividades caritativas e culturais em vez de aplicar tudo em ações ou reinvestir em seus próprios negócios.
A visão restrita vê essas coisas como fora da alçada dos homens de negócios, levando em conta as mais amplas ramificações dessas decisões em um processo sistêmico complexo. De acordo com a visão restrita do conhecimento humano, o que cabe ao homem de negócios é a direção de sua firma individual para promover, dento da lei, sua prosperidade. É no efeito sistemático da concorrência, mais do que nas intenções individuais dos homens de negócios, que esta visão confia para produzir benefícios sociais. Segundo Adam Smith, é somente quando o homem de negócios "busca seu próprio ganho" que ele contribui - através do processo de concorrência - na promoção do bem social "mais efetivamente do que quando realmente tem a intenção de promovê-lo". (p. 70)
Os textos escritos pelos partidários da visão restrita têm muitos exemplos de consequências contraproducentes de políticas bem intencionadas. Porém, para os partidários da visão irrestrita, isso significa se ater somente a erros isolados que podem ser corrigidos, a fim de se opor a tendências que são socialmente benéficas como um todo. (p. 70)
Na visão restrita, o dever moral do homem de negócios é a fidelidade aos acionários, que lhe confiaram sua poupança, não a busca sincera do bem público por meio de doações caritativas, investimentos ou decisões relativas a contratações capazes de comprometer essa confiança. De forma semelhante, o dever moral do juiz é executar fielmente a lei que jurou respeitar, não mudar sinceramente aquela lei para produzir resultados melhores de acordo com o que vê. Dentro dessa visão, um dever moral de uma pessoa dotada de conhecimento é promover fielmente o processo intelectual entre seus alunos e leitores, não levá-los a conclusões específicas que ele sinceramente vê como as melhores para a sociedade. (p. 72)
É necessário observar que nenhuma das grandes visões históricas se mostra como 100% irrestrita ou 100% restrita. (p. 74)
Adam Smith considerava inapropriado que jovens gozassem da mesma confiança que os velhos. "Os mais s[abios e experientes são em geral os menos crédulos", disse ele, e isso dependia fundamentalmente do tempo: "Somente a sabedoria adquirida e a experiência podem ensinar a incredulidade, e muito frequentemente a ensinam o bastante". (p. 76)
A arrogância e o exibicionismo de intelectuais foram, do mesmo modo, temas recorrentes na obra de Burke - assim como os perigos que esses intelectuais representavam para a sociedade. Ele falou de suas "grandes teorias" para as quais teriam de se curvar o céu e a terra. Hobbes também via aqueles que "se veem como mais sábios e mais capazes de governar" como fontes de distração e de guerra civil. Da mesma forma, Hamilton via os intelectuais como perigosos, por causa de sua tendência de seguir "os fantasmas traiçoeiros de um espírito de inovação sempre sedento e nunca satisfeito". (p. 80)
Contudo, para os adeptos da visão irrestrita, os intelectuais são "precursores para seus pares na descoberta da verdade", segundo Godwin. (p. 81)
A visão restrita não é uma visão estática do processo social, tampouco uma visão de que o status quo deveria ser alterado. Pelo contrário, seu princípio central é a evolução. (p. 86)
Na visão restrita da natureza humana, esse tipo de desenvolvimento não tem probabilidade de se tornar geral, de tal forma que a injustiça de pagar a indivíduos recompensas imerecidas deve ser compensada pela injustiça de tirar da sociedade benefícios existentes, não pagando o suficiente para oferecer incentivos para sua produção e plena utilização. (p. 105)
Na visão irrestrita, a própria natureza humana é uma variável, e, de fato, a variável fundamental a ser mudada. (p. 106)
Quando há pessoas que vivem abaixo de algum nível econômico definido como pobreza, os adeptos da visão irrestrita tendem a querer subsidiá-los de alguma forma para produzir diretamente um resultado mais desejável na forma de um padrão de vida mais elevado. Os partidários da visão restrita voltam-se para incentivos de processo, criados por esses planos e suas consequências no comportamento futuro, não somente entre esses beneficiários específicos, mas também em relação a outros que podem se tornar menos cuidadosos quando se trata de evitar o desemprego, a gravidez em adolescentes ou outros fatores vistos como geradores da incidência geral de pobreza. (p. 113)
Essas mudanças podem ser repentinas, em que um evento em particular reorienta todo o pensamento de alguém, ou a mudança pode ser análoga à água que desgasta a pedra, de forma que uma visão imperceptivelmente desaparece, para ser substituída por um conjunto de mudanças dos pressupostos inerentes sobre o homem e o mundo. Esse segundo tipo de mudança pode não deixar um registro claro de quando ou como aconteceu, talvez nem uma consciência nas pessoas envolvidas, a não ser saber que as coisas não são mais vistas da mesma forma que já foram.
Algumas mudanças de visões tendem a ser associadas à idade. O clichê dos radicais aos vinte anos, que se tornam conservadores aos quarenta, data de muitas gerações. (p. 115)
O melhor tipo de mundo para o homem tal como é concebido por uma visão é desastroso para o homem segundo a concepção da outra visão. Os partidários das duas visões estão, portanto, predestinados a serem adversários em uma questão após a outra. (p. 119)
Nas duas visões, o ser hipotético define princípios sociais, mas o locus de controle continua a ser pessoas reais operando coletivamente por meio de representantes, segundo Rawls, e individualmente, de acordo com Smith. Uma estrutura social é um produto coletivo, tanto na visão restrita quanto na irrestrita, mas o exercício de controle contínuo é o que os separa dentro do autointeresse individual dos tomadores de decisão da visão restrita e os decisores representantes para a coletividade da visão irrestrita. (p. 124)
Uma determinada visão pode encaixar-se em qualquer ponto no continuum entre as visões restritas e irrestritas. Também há a possibilidade de combinação de elementos das duas visões de forma tanto consistente quanto inconsistente. O marxismo e o utilitarismo são exemplos clássicos de visões híbridas, embora de formas diferentes. (p. 125)
A teoria marxista da história é essencialmente uma visão restrita, com restrições cada vez menores ao longo dos séculos, terminando no mundo irrestrito do comunismo. (p. 125)
Nas palavras de Engels, "cada desejo individual é obstruído por todos os outros e o que emerge é algo que ninguém quis". (p. 127)
Bentham rejeitava a tomada de decisão na economia por representantes e dizia que um adulto livre e racional deveria ter a liberdade de fazer qualquer negociação financeira não fraudulenta de sua escolha. (p. 131)
O que está no âmago da diferença entre elas é saber se as capacidades e o potencial humanos permitem que decisões sociais sejam tomadas coletivamente através da racionalidade articulada de representantes, para produzir os resultados sociais específicos desejados. A questão crucial é, afinal, não o que é especificamente desejado (uma questão de premissas de valor), mas o que de fato pode ser alcançado (uma questão factual e de causa e efeito), embora, em termos práticos, objetivos considerados inalcançáveis sejam rejeitados, mesmo sendo reconhecidos como moralmente superiores em termos abstratos. (p. 135)
O fascismo apropriou-se de alguns aspectos simbólicos da visão restrita, sem os processos sistêmicos que lhe deram sentido. Foi uma visão irrestrita de governança que atribuiu a seus líderes uma abrangência de conhecimento e dedicação ao bem comum inteiramente incompatível com a visão cujos símbolos evocava.
Adeptos tanto da visão restrita quanto da irrestrita veem o fascismo como a extensão lógica da visão do adversário. Para os que estão na esquerda política, o fascismo é "a extrema direita". Inversamente, para Hayek, o "nacional socialismo" (nazismo) de Hitler foi de fato socialista em seu conceito e execução. (p. 137)
Segundo Condorcet, "uma verdadeira igualdade" requer que "mesmo as diferenças naturais entre homens sejam mitigadas" pela política social. Sem probabilidades iguais de alcançar determinados resultados, a igualdade formal era inadequada - quando não hipócrita - ,segundo a visão irrestrita. George Bernard Shaw, por exemplo, ridicularizou a igualdade formal de oportunidades: "Dê a seu filho uma caneta tinteiro e um punhado de papel, diga-lhe que agora ele tem uma oportunidade igual à minha de escrever peças e veja o que ele lhe dirá!". (p. 146)
Isso não queria apenas dizer que alguns têm pouco enquanto outros têm muito. Causa e efeito estão presentes: alguns têm pouco porque outros têm muito, segundo esse raciocínio que durante séculos fez parte da visão irrestrita. (p. 148)
A consciência sobre as desigualdades e a repulsa em relação a elas não se restringiam aos adeptos da visão irrestrita. Reações semelhantes têm sido comuns desde Adam Smith no século XVIII a Milton Friedman no século XX. (p. 149)
Na visão restrita de Friedman e de outros, acreditava-se que as situações de "exploração" podiam ser eliminadas de forma mais efetiva por características sistêmicas de uma economia competitiva do que por intervenção de líderes políticos em processos econômicos complexos que não podem compreender. O perigo não estava comente nas consequências adversas de sua intervenção na economia, porém mais nas horríveis consequências de uma concentração tão grande do poder político. Resumindo, as tentativas de igualar os resultados econômicos levam a uma maior - e mais perigosa - desigualdade do poder político. Esse foi o tema central de O Caminho da Servidão de Hayek, em que o objetivo de combinar simultaneamente liberdade e igualdade de resultados no socialismo democrático foi declarado como "inalcançável" enquanto resultado, mas perigoso enquanto um processo de mudança rumo ao despotismo.
Socialistas democratas não foram acusados de conspirar para instaurar um despotismo; eram, na verdade, considerados por Hayek indivíduos genuinamente humanos sem a "crueldade" necessária para atingir seus objetivos sociais, mas também eram vistos por ele como pavimentadores do caminho para outros - incluindo fascistas e comunistas - que concluiriam a destruição da liberdade depois de minar irremediavelmente os princípios de igualdade perante a lei e as limitações no poder político na busca da "ilusão de justiça social". (p. 152)
Hayek questionou "se é moral que homens se submetam ao poder da direção que teria de ser exercida para que os benefícios provenientes de indivíduos fossem significativamente descritos como justos ou injustos". (p. 153)
No mundo do século XVIII, em que a maior parte das pessoas era composta de camponeses, Godwin declarou que "o camponês passa pela vida, com algo da insensibilidade desprezível de uma ostra". Rousseau comparava as massas a "um inválido estúpido, pusilânime". Segundo Condorcet, a "raça humana ainda revolta o filósofo que contempla sua história". No século XX, George Bernard Shaw incluía a classe operária entre as pessoas "detestáveis" que "não têm o direito de viver". Ele dizia, ainda: "Eu ficaria desesperado se não soubesse que eles vão todos morrer logo, e não há necessidade alguma de que sejam substituídos por pessoas como eles".
Embora a visão irrestrita tenha caracterizado o igualitarismo como uma convicção de que as pessoas deveriam dividir de forma mais igual os benefícios materiais e de outros tipos da sociedade, ela tente a ver as capacidades existentes das pessoas como muito mais desiguais do que a visão restrita. Entre os economistas contemporâneos que propõem caminhos para países do Terceiro Mundo para sair da pobreza, aqueles que representam uma visão restrita (P. T. Bauer e T. W. Schultz, por exemplo) descrevem as massas de camponeses do Terceiro Mundo como um depósito de habilidades valiosas e capazes de adaptações significativas para mudar condições econômicas, contanto que as elites permitam que concorram no mercado, enquanto aqueles que são politicamente mais de esquerda, como Gunnar Myrdal, descrevem as massas de camponeses como extremamente atrasadas e redimíveis somente por meio dos esforços comprometidos da elite instruída. (p. 161)
Não é sobre o nível de igualdade que as duas visões discordam, mas sobre o que deve ser igualado. Na visão restrita, é o julgamento que deve ser exercido de forma igual e individual tanto quanto possível, sob a influência das tradições e dos valores provenientes da experiência de muitos, amplamente compartilhada, mais do que da articulação especial de poucos. Na visão irrestrita, são as condições materiais da vida que devem ser igualados sob a influência ou poder daqueles que têm as condições intelectuais e morais necessárias para fazer que o bem-estar de outros se torne sua preocupação específica. (p. 164)
Para os adeptos da visão restrita, as pessoas cometem crimes porque são humanas - porque colocam seus próprios interesses ou egos acima dos interesses, sentimentos ou vidas de outros. Partidários da visão restrita põem ênfase em estratagemas sociais para evitar o crime ou castigo, ou seja, para desencorajá-los. Mas para o partidário da visão irrestrita é difícil entender como alguém cometeria um crime terrível sem que houvesse uma causa específica, ainda que fosse a cegueira. (p. 171)
Enquanto Smith via a imposição de uma punição como uma tarefa dolorosa, adeptos da visão irrestrita viam essa questão como uma indulgência desnecessária na vingança, "um retrocesso embrutecedor para todo o horror da desumanidade do homem de tempos remotos". Com essa visão, o criminoso é visto como uma vítima - uma "pobre vítima", segundo palavras de Godwin - primeiramente, das circunstâncias especiais que provocaram o crime, e depois, de pessoas com sede de castigo. (p. 174)
O individualismo adquire significados totalmente diferentes nas duas visões. Na visão restrita, o individualismo significa deixar o indivíduo livre para escolher entre as oportunidades, recompensas sistematicamente geradas, e castigos provenientes de outros indivíduos também livres, sem se submeter a conclusões articuladas impostas pelo poder de entidades organizadoras como o governo, sindicatos ou cartéis. Todavia, na visão irrestrita, o individualismo refere-se ao (1) direito de indivíduos comuns "participarem" das decisões articuladas de entidades coletivas e ao (2) direito daqueles com a sabedoria e a virtude necessárias de terem alguma imunidade em relação a restrições sociais sistêmicas ou organizadas. (p. 178)
Não costuma surpreender dizer que as razões pelas quais o governo exerce o poder na economia também diferem nas duas visões. Na visão irrestrita, é uma questão de intenção, enquanto para a visão restrita, é uma questão de incentivos. A intenção do governo de proteger interesses públicos obriga-o a interferir na economia para desfazer o mal feito pelo poder econômico privado, de acordo com a visão irrestrita. Entretanto, o incentivo inerente ao governo no sentido de aumentar seu próprio poder leva-o a interferir frequentemente de forma desnecessária e maléfica, segundo a visão restrita. (p. 181)
Na visão irrestrita, para a qual os resultados e não os processos são fundamentais, se o comportamento escolhido por A mudar o comportamento de B, então A forçou B a se comportar de determinada forma. Por exemplo, segundo Tribe, se o governo se recusar a pagar abortos de mulheres indigentes, então ele provoca "partos forçados", fazendo, na verdade, com que "mulheres (pelo menos mulheres pobres) sejam incubadoras involuntárias", portanto, "negando às mulheres o poder sobre seu próprio corpo e futuro". (p. 194)
Os benefícios fundamentais dos direitos de propriedade foram concebidos como sociais, permitindo um processo econômico com maior eficiência, um processo social com menos discórdia e um processo político com mais poder e influência difusos do que o possível controle político subcentralizado da economia. (p. 214)
Independentemente de seus mecanismos ou detalhes, a justiça social tem sido o tema dominante da visão irrestrita, de Godwin a Rawls. Como outras formas de justiça, ela é concebida mais como um resultado do que como um processo. Porém, enquanto o imperativo da justiça social permeia a visão irrestrita, ele é praticamente inexistente na visão restrita. Pensadores sociais na tradição da visão restrita consideram seus aspectos humanos, assim como questões de eficácia, mas isso não implica que um resultado de distribuição de renda seja mais justo do que outro. F.A.Hayek é um dos poucos escritores da visão restrita que discute a justiça social - e ele a caracteriza como "absurda", uma "miragem", "uma invocação vazia", "uma superstição quase religiosa" e um conceito de que "não pertence à categoria do erro, mas à da estupidez". Outros contemporâneos na tradição da visão restrita - Milton Friedman e Richard Posner, por exemplo - não se incomodam em discuti-la, ainda que seja como algo a ser refutado.
O conceito de justiça social, portanto, representa os extremos do conflito de visões - uma ideia da maior importância para uma das visões e abaixo da crítica para a outra. (p. 221)
O que distingue a visão irrestrita não é o fato de prescrever preocupação humana em relação aos pobres, mas de ver as transferências de benefícios materiais ao menos afortunados não simplesmente uma questão de humanidade, mas, sobretudo, como uma questão de justiça. (p. 222)
Fundamentalmente para o conceito de justiça social é a noção de que indivíduos têm direito a alguma parte da riqueza produzida por uma sociedade simplesmente por serem membros daquela sociedade, independentemente de quaisquer contribuições individuais feitas ou não para a produção de tal riqueza. (p. 222)
Segundo Godwin: "O efeito produzido por essa doutrina condescendente é que a satisfação de nossos desejos fica à disposição de uns poucos, permitindo-lhes fazer demonstração de generosidade com o que de fato não lhes pertence, bem como comprar a submissão dos pobres mediante o pagamento de uma dívida". (p. 223)
Hayek via alguns defensores da justiça social como cinicamente cientes de participarem da concentração de poder; via, contudo, perigo maior naqueles que sinceramente promoviam o conceito com um fervor que inconscientemente prepara o caminho para outros - totalitaristas - intervirem depois da ruína de barreiras ideológicas, políticas e legais ao poder do governo, tornando sua tarefa fácil. Ele via o nazismo dessa forma, como "a culminância de uma longa evolução de pensamento" na Alemanha promovida por socialistas e outros que tinham objetivos muito diferentes dos nazistas, mas que fomentaram a erosão do respeito por regras legais a favor de imperativos de resultados sociais específicos.
O comunismo também foi visto por Hayek como um beneficiário residual da maneira de pensar promovida por pessoas que podem não ter o desejo de ver o comunismo triunfar. Segundo Hayek, a "justiça distributiva" é inerentemente "irreconciliável com o princípio e direito", e o ideal de um governo de leis e não de homens é tudo o que separa uma sociedade livre e o totalitarismo. Ele cita um escritor soviético que declarou que o "comunismo significa não a vitória da lei socialista, mas a vitória do socialismo sobre qualquer lei". Para Hayek, isso é o que a justiça social como objetivo ignorado afinal significa - uma alternativa para a justiça meramente "formal" como regras impessoais de um processo. (p. 228)
Muito do que a visão irrestrita vê como moralmente necessário a ser feito, a visão restrita vê como impossível ao homem fazer. (p. 231)
Um exemplo desse fenômeno é a declaração frequentemente repetida de que índices mais altos de lares desfeitos e de gravidez na adolescência entre os norte-americanos negros eram devidos ao "legado da escravidão". Somente depois de décadas de ampla repetição dessa afirmação foi feito um estudo abrangente factual, no qual se mostrou que lares desfeitos e gravidez na adolescência era de longe menos comuns entre os negros submetidos à escravidão e as gerações que vieram depois da emancipação do que as de hoje. Uma vez mais a questão não é que uma determinada conclusão estava equivocada, mas que uma afirmação ampla e sem fundamento não foi contestada ao longo de muitos anos porque era adequada para determinada visão. A capacidade de sustentar asserções sem evidências é outro sinal da força e persistência das visões. (p. 244)
As duas visões devem omitir coisas que existem na realidade, e que a maioria dos defensores dessas visões admitiria existir na realidade, por mais que discordassem sobre a prevalência ou o efeito dos fatores omitidos. (p. 245)
A crescente complexidade de teorias geralmente reflete, em parte, as crescentes dificuldades de defendê-las em suas formas mais puras. Dados empíricos florescentes, e formas ainda mais sofisticadas de analisá-los, podem não conseguir dar um único golpe fatal a qualquer uma das grandes visões contrárias que dominaram os dois últimos séculos. Porém tem havido alguns recuos estratégicos importantes dos dois lados. Nenhuma das visões pode manter com segurança o ar de verdade irrefutável que alguns de seus partidários do século XVIII tinham. (p. 247)
Valores são vitais. Mas a questão de que tratamos aqui é se antecedem ou seguem as visões. A conclusão de que provavelmente decorrem de visões mais do que as visões resultam deles não é simplesmente a conclusão desta análise em particular, mas é, ainda, demonstrada pelo comportamento real daqueles que têm o poder de controlar ideias por meio da sociedade, quer essas autoridades sejam seculares ou religiosas. (p. 251)
Adeptos da visão restrita e da irrestrita reconheceram há muito tempo que (...) o que é dito nessas lutas políticas não tem necessariamente ligação com a verdade, ou mesmo com o que qualquer um acredita ser a verdade. (p. 252)
Como alguns dos conceitos-chave usados pelos dois lados foram definidos originalmente nos termos da visão restrita, os adeptos da visão irrestrita tiveram que diferenciar seus conceitos como "verdadeira" liberdade, ou "verdadeira" igualdade, por exemplo, em oposição simplesmente a liberdade "formal" ou igualdade "formal". Entretanto, a ascendência posterior da visão irrestrita obrigou os adeptos da visão restrita a ter uma postura defensiva, na qual tentavam estabelecer as definições mais formais, restritas desses termos como características de processo. (p. 259)
terça-feira, 16 de maio de 2017
Como identificar um psicopata : Cuidado! Ele pode estar mais perto do que você imagina - Karry Daynes, Jessica Fellowes (2012)
Um escorpião e uma rã encontraram-se às margens de um riacho. O escorpião queria atravessar para o outro lado e, então, pediu à rã que o levasse nas costas.
- Mas como saberei que você não vai me picar? - perguntou a rã desconfiada.
- É lógico que não vou fazer isso - respondeu o escorpião. - Se eu pocá-la, também morrerei.
Satisfeita, a rã concordou, e o escorpião subiu em suas costas.
Na metade da travessia, o escorpião deu uma ferroada na rã, condenando ambos à morte.
- Por que você fez isso? - gritou a rã moribunda.
- Porque essa é minha natureza - respondeu o escorpião. (p. 11)
Os cientistas calculam que entre 1% e 3% da população em geral seja psicopata. Portanto, se você tem cem amigos do Facebook, pelo menos um deles pode ser um psicopata (a menos que todas as suas amizades sejam da prisão; nesse caso, a porcentagem sobe para 15%). (p. 14)
A única coisa que os psicopatas têm em comum é uma série de problemas emocionais e comportamentos antissociais capazes de causar um grande estrago em famílias, organizações e comunidades inteiras. Esse é um quadro resistente ao tratamento. Destituídos de qualquer empatia, eles tentam obter aquilo que querem sem se importar com quem atravessa o seu caminho. Com charme, manipulação e muita habilidade, eles seguem em direção a sua carreira, sua casa - e até mesmo seu coração. (p. 15)
Não tenha nenhuma dúvida: se houver um possível psicopata na sua vida, você precisará escapar dele rapidamente. (p. 16)
Conheci alguns dos criminosos psicopatas mais famosos do país. E sei como alguns deles podem ser manipuladores, charmosos e inteligentes. (p. 16)
Como querem causar uma boa impressão, os psicopatas costumam demonstrar uma falsa preocupação com o bem-estar do entrevistador. (p. 17)
Atualmente, o padrão internacional para avaliação e diagnóstico de psicopatia é a escala PCL-R (lista de verificação de psicopatia - Psychopathy Checklist Revised), criada pelo dr. Robert Hare em 1991. Trata-se de um instrumento extensamente pesquisado que mede o grau em que uma pessoa demonstra as vinte qualidades fundamentais de um psicopata. A avaliação por meio da escala PCL-R é complexa e tem de ser feita por um psicólogo devidamente qualificado e altamente treinado. (p. 20)
Na prática, a escala PCL-R agrupa as características que definem um psicopata de acordo com dois fatores amplos: traços de personalidade e estilo de vida desviante. Para ser um psicopata é preciso ter evidências tanto de características de personalidade como de estilo de vida, embora cada pessoa tenha uma combinação diferente. (p. 22)
Os psicopatas são incapazes de qualquer sutileza ou emoção profunda; seus sentimentos geralmente não passam de reações primitivas passageiras às suas vontades e necessidades imediatas. Portanto, eles também não têm capacidade de compreender os sentimentos alheios; são indiferentes aos direitos ou ao bem-estar das outras pessoas, que consideram meros objetos a serem manipulados a seu bel-prazer. o entanto, o psicopata é capaz de ocultar sua natureza fria e predatória por trás de um charme cativante. (p. 22)
Os psicopatas acham que têm o direito de ter tudo o que querem, não importa a que preço, e costumam ter explosões violentas e descontroladas quando são criticados ou frustrados. Assim como o escorpião da fábula, faz parte da natureza deles usar e prejudicar os outros, embora muitas vezes acabem inadvertidamente dando um tiro no próprio pé. Apesar de jamais admitirem, os psicopatas culpam a tudo e a todos - mas nunca a si mesmos - por seus problemas. (p. 22)
Psicopatas e narcisistas podem ser convenientemente considerados primos de primeiro grau. (p. 24)
Há um grupo distinto - às vezes, formado por indivíduos denominados psicopatas "bem-sucedidos" ou "sub-clínicos" - que não trilha o caminho óbvio do crime. Talvez sejam particularmente inteligentes ou cultos, menos fortuitos do que o psicopata típico, talvez tenham desenvolvido habilidades sociais altamente refinadas e conseguido se inserir em um setor da sociedade em que foram aceitos e conquistaram confiança - por exemplo, um advogado, um corretor e valores ou até mesmo um psiquiatra. Outros psicopatas aperam nos limites da lei: sua conduta pode não ser ilegal - não exatamente -, mas é imoral e possivelmente devastadora para aqueles que têm a infelicidade de se envolver com eles. Outros simplesmente ainda não foram apanhados e conseguem, com bastante sagacidade, manipular, intimidar ou aterrorizar a família, os amigos, os colegas e os sócios, fazendo com que se calem diante de sua má conduta. (p. 27)
A American Psychiatric Association [Associação Americana de Psiquiatria] calcula que aproximadamente 3% dos homens e 1% das mulheres na população em geral sejam psicopatas. (p. 30)
Definitivamente, não, psicopatia não tem "cura", e os programas genéricos para tratamento de criminosos não surtem efeito nos psicopatas. (p. 30)
Embora os estudos não identifiquem que os psicopatas tenham alguma lesão cerebral, seu cérebro realmente parece ser diferente do das outras pessoas. Por exemplo, técnicas de neuroimagem revelaram que, quando os psicopatas são solicitados a realizar tarefas que requerem o processamento de palavras carregadas de emoção, as partes do seu cérebro que são ativadas não são as mesmas dos grupos de controle normais. (p. 31)
De vez em quando você ouvirá as pessoas falarem de "sociopatas", além de psicopatas, mas na verdade não existe diferença entre os dois termos: ambos são usados omo sinônimos. Grosso modo, o termo sociopata é mais um americanismo, de modo que um psicopata pode virar sociopata ao cruzar o Atlântico. (p. 31)
Há mais narcisistas no mundo dos negócios do que na população carcerária. (p. 36)
A sedução é apenas outra arma que o psicopata usa para obter poder, e a regra "é proibido relacionamento amoroso entre colegas de trabalho" não será sequer considerada. Ele considera o sexo com seus subordinados uma das vantagens do trabalho. (p. 41)
Os psicopatas não têm ética empresarial - eles não entendem o que quer dizer trabalhar "para o bem da empresa", e você nunca vai ouvi-los dizer que não existe "eu" em equipe. Eles simplesmente acham que lealdade é coisa de "perdedor". (p. 43)
Você já ouviu a expressão "Ele venderia a própria mãe..."? Essa é a atitude do psicopata superambicioso. Ele não sente culpa nem remorso nem vergonha. Se um psicopata parece ser leal a alguém, é só porque ele sabe que essa pessoa poderá ser útil a longo prazo. (p. 63)
Os psicopatas não cedem diante da adversidade. Mas o que parece coragem estoica ou imunidade ao fracasso não passa de incapacidade de aprender com a punição e, consequentemente, modificar seu comportamento. (p. 64)
Ao que parece, muitas das qualidades apreciadas em um empreendedor de sucesso são extraordinariamente semelhantes a muitas das características de um psicopata: autoconfiança delirante, autoritarismo arrogante, busca implacável por dinheiro, capacidade de vender a própria mãe e absoluta despreocupação em relação ao fracasso. (p. 72)
Para escolher seu alvo, os psicopatas têm um truque na manga. Eles são grandes mímicos e, às vezes, imitam o jeito de falar (ritmo da fala, uso específico de alguns termos, etc.) e os gestos de uma pessoa. Isso por si só já cria um clima favorável: somos inconscientemente levados a nos sentir mais à vontade e a gostar de alguém que pareça estar em "sintonia" conosco. (p. 79)
Todos os relacionamentos dos psicopatas estão ligados à exploração - eles sempre usam outra pessoa para realizar seus desejos. (p. 80)
Os psicopatas fazem mais gestos casuais com as mãos (conhecidos como "batidas") do que os que não são psicopatas, particularmente quando falam de assuntos sentimentais ou interpessoais, como descrições de relações familiares e do início da vida familiar. Os psicólogos acreditam que isso seja um sinal do grande esforço cognitivo que eles precisam fazer para discutir sentimentos e conceitos que, para eles, são abstratos. (Pense no movimento que você faz com as mãos quando está tentando se lembrar de uma palavra.) Psicopatas criminosos fazem menos gestos com as mãos quando falam sobre os crimes que cometeram, uma vez que conhecem bem essa situação, que tem mais significado para eles. (p. 83)
Os psicopatas não têm sentimentos relativos a laços familiares, sejam deles ou de outras pessoas. Para eles, seus pretensos amigos mais próximos e queridos nada mais são do que recursos adicionais a serem sugados. (p. 85)
Sem nenhuma consideração pelos planos alheios e sem pesar as consequências, o psicopata só faz o que quer e quando quer. (p. 85)
Os psicopatas normalmente são descritos como alguém que tem "o dom da palavra", mas é o seu jeito de falar que atrai a nossa atenção, e não o seu uso eloquente das palavras. Na verdade, os especialistas observaram que a linguagem usada pelo psicopata tem características peculiares e desajeitadas que podem passar despercebidas ao ouvinte mais desavisado. (p. 87)
Os psicopatas parecem juntar as palavras de forma estranha - cometem lapsos linguísticos ou malapropismos. (p. 87)
Hare diz que é "como se os psicopatas tivessem dificuldade de controlar a própria fala", permitindo, assim, fluxos complicados e mal organizados de palavras e pensamentos. (p. 87)
Pode ser que o estilo idiossincrático do psicopata seja produto de um cérebro atipicamente "lateralizado". Na maioria das pessoas, o hemisfério esquerdo do cérebro tem o controle primário sobre a maneira como as palavras são usadas e compreendidas. Mas há indícios de que, nos psicopatas, os centros de linguagem sejam bilaterais - quer dizer: estão localizados em ambos os hemisférios. Isso significa que as informações verbais têm de passar pelos dois hemisférios e podem, portanto, tornar-se mais facilmente desordenadas. (p. 88)
A psicóloga Debra Oswald, Ph.D. pela Marquette University, em Milwaukee, Estados Unidos, diz que os laços de amizade precisam de quatro pilares para se manter: confidência e apoio constantes (ambos necessários para criar intimidade), interação (telefonemas, e-mails ou visita aos amigos) e positividade (uma amizade gratificante nos motiva a mantê-la viva). Para acabar com uma amizade prejudicial é preciso deixar de fazer essas quatro coisas. Um psicopata terá dificuldade de seduzi-lo se você não lhe der informações íntimas, não lhe telefonar e não apoiar seus planos ou desejos. (p. 93)
O olhar fixo e penetrante de um psicopata pode ser muito sedutor. Até mesmo um encontro casual e descompromissado com um psicopata pode ser difícil: eles têm tendência para expressar rapidamente emoções profundas - e se você estiver procurando alguém para amar, essa pode ser a isca perfeita para fisgar você. (p. 94)
Com o aumento crescente do número de encontros marcados pela Internet nos últimos anos, nunca foi tão importante ficar atento em relação à pessoa com quem exatamente estamos planejando dividir uma garrafa de vinho. Um psicopata pode esconder facilmente sua verdadeira personalidade por trás de uma tela de computador. Mentirosos prolíficos, eles dizem exatamente aquilo que você quer ouvir para obter aquilo que querem. (p. 95)
Se for usar um site de namoro, use um que seja conhecido, que os membros precisem pagar para se inscrever; ele protegerá seus dados pessoais e terá medidas contra uso inapropriado. Veja se você pode "bloquear" pessoas quando não quiser saber delas.
Observe as regras usuais de segurança - marque encontro em um local público, informe a uma amiga para onde você está indo, tome as providências necessárias para ir e voltar sozinha, leve o celular carregado, não fique bêbada nem tire os olhos do seu copo de bebida.
Desconfie de uma pessoa que sofre de Síndrome de Excesso de Informação, principalmente se ela lhe contar uma história de arrancar lágrimas ou histórias implausíveis sobre seu heroísmo. (p. 113)
Existem duas fases no desenvolvimento emocional da criança em que se espera que "traços de psicopatia" apareçam, pelo menos até certo ponto. De 2 a 3 anos de idade, as crianças estão começando a desenvolver suas habilidades mentais de raciocínio, mas ainda são muito egocêntricas e não conseguem distinguir direito a fantasia da realidade. (p. 117)
A segunda fase de "psicopatia do desenvolvimento" é a adolescência. Os psicólogos evolucionistas descrevem esse período como um período de "tempestade e stress". É um momento em que os hormônios, o corpo em transformação e o aumento dos níveis de responsabilidade conspiram para transformar crianças, que antes eram umas gracinhas, em diabinhos beligerantes, rabugentos e inflexíveis. (p. 117)
Os neurocientistas acreditam que, assim como o cérebro das crianças é "moldado" nos primeiros anos de vida, durante a adolescência também ocorrem algumas reestruturações fundamentais.
Os lobos frontais e parietais, especificamente relacionados com autocontrole, apresentam um crescimento repentino entre 10 e 12 anos. A esse crescimento segue-se uma drástica redução das conexões sinápticas durante a adolescência. (p. 118)
A opinião de Hare é que "a psicopatia é resultado de uma complexa - e mal compreendida - interação entre fatores biológicos e forças sociais". (p. 119)
Os psicopatas são criaturas que busca, estímulos, e o abuso de drogas é comum em psicopatas adolescentes, pois essa é uma forma barata e acessível de atender às suas necessidades de estimulação. (p. 124)
Os sinais mais preocupantes que poderiam indicar um comportamento psicopata são: roubas coisas de outras crianças e dos pais; praticar atos de vandalismo; provocar incêndio; ferir ou matar animais; praticar bullying; ter experiência sexual precoce e extrema, principalmente envolvendo coação de outras crianças; ausentar-se de casa e matar aulas sem dar explicação; não responder a repreensões e castigos. Lembre-se de que os psicopatas exibem um conjunto de comportamentos, portanto, não entre em pânico com um ou dois incidentes isolados. (p. 132)
Estudos mostram uma elevada "comorbidade" entre tendências psicopatas e Transtornos de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), ou seja, eles frequentemente ocorrem juntos. Além disso, o TDAH pode ser encontrado em até 75% dos casos de crianças psicopatas. (p. 133)
Não há nenhuma ligação conclusiva entre videogames violentos e violência grave em crianças ou adultos, mas é possível que eles aumentem o nosso "limiar de violência" ao nos tornar insensíveis a atos extremos e nos recompensar por eles - afinal, esses jogos recompensam atos como assassinato. (p. 135)
O comportamento violento se desenvolve progressivamente, por isso, cabe aos adultos próximos à criança monitorar sinais observáveis no processo evolutivo da agressão. (p. 138)
Destituídos de qualquer sentimento de empatia, os pais psicopatas costumam cuidar dos filhos de forma mecânica. É como se os filhos fossem bonecos; eles são incapazes de compreender as necessidades do bebê e, portanto, ignoram seu choro ou sua fralda suja. A criança pode até mesmo ser vista como uma mera mercadoria. (p. 151)
De acordo com inúmeros estudos e pesquisas, particularmente aqueles que envolvem tomografias cerebrais, existem fortes indícios de que a psicopatia seja uma condição genética. No mínimo, existe uma predisposição genética que pode conduzir determinada pessoa ao ambiente certo (ou melhor, errado) para o desenvolvimento de psicopatia. (p. 159)
Especialistas em psicologia evolutiva propuseram a teoria de que a psicopatia é uma estratégia reprodutiva viável. Harris e Rice ressaltaram que muitas características do psicopata - busca de sensações e propensão à violência - teriam sico úteis para impressionar o sexo oposto na época dos homens da caverna e poderiam, portanto, ser uma forma de a Mãe Natureza garantir a geração seguinte.
Os psicopatas geralmente são promíscuos e infiéis; para Hate, provavelmente a consequência desse comportamento é o fato de os psicopatas - tanto do sexo masculino como do feminino - terem muitos e muitos filhos, embora seja pouco provável que cuidem muito bem deles (se realmente participarem da vida deles). (p. 165)
O argumento contra essa teoria é que a propensão dos psicopatas a correr riscos não se encaixa nesse perfil; não é fácil passar adiante seus genes quando você está constantemente arriscando sua vida, como fazem muitos psicopatas (consumindo drogas, dirigindo em alta velocidade, etc.). (p. 166)
Lembre-se de que alguém que o maltrata não merece fazer parte da sua vida, mesmo que sejam seus pais. Não se sinta na obrigação de lhes dar dinheiro ou um lugar na sua casa. Se você já tem sua própria família, faça dela a sua prioridade. (p. 167)
O que confunde é que os psicopatas conseguem tapear muito bem suas vítimas se fazendo de carinhosos. Quando são inteligentes, eles aprendem os comportamentos sociais certos para enganar a maioria das pessoas a maior parte do tempo. Quando um psicopata quer desviar sua atenção de algo que revele sua verdadeira natureza, ele diz que ama você. mas é óbvio que ele não sente amor. (p. 173)
Os psicopatas frequentemente adotam um estilo de romance do tipo "água com açúcar" - chocolates, flores, poesia. (p. 174)
Nos casos mais graves, o psicopata pode manipular sua parceira reagindo às suas queixas com maus-tratos a alguém ou algo que signifique muito para ela - classicamente, animais de estimação ou crianças. (p. 175)
Pornografia, prostituição ou, mais comumente, lenocínio é comum entre psicopatas. (p. 177)
Compromisso não é um conceito que os psicopatas entendam, mas eles têm consciência de todas as vantagens financeiras, além de outras, que viver com um parceiro pode trazer. (p. 179)
Em alguns estudos, crianças e adultos que exibiam tendências psicopatas foram solicitados a ouvir uma gravação de vozes e a descrever a emoção contida nessas vozes, mas tiveram dificuldade em fazê-lo. Um resultado semelhante foi observado num estudo em que psicopatas foram solicitados a identificar a emoção expressa no rosto de outras pessoas e eles se mostraram insensíveis a sentimentos de medo, aversão e tristeza. Os pesquisadores descobriram também que, diante de um rosto com expressão neutra e que lentamente se transformava em expressão de medo, os psicopatas levaram um tempo significativamente maior para identificar a emoção do que os não psicopatas. Eles precisaram de 75% da expressão para poder detectar o medo, e os que não eram psicopatas precisaram de 65% da expressão. (p. 186)
Assim como em qualquer outra área de manipulação ou fraude, um psicopata em busca de uma parceira escolhe sua vítima com cuidado. Ele escolhe uma mulher solitária e vulnerável, ou muito bem-sucedida, que possa lhe dar o status que deseja. Hábil manipulador, ele usa uma série de recompensas e ameaças para conseguir exatamente o que quer de sua vítima. Finalmente, quando consegue, ele a abandona, deixando-a perplexa e confusa. Em geral, ele volta várias vezes. O relacionamento com um psicopata pode ser verdadeiramente devastador. Mas entendo que a dinâmica dessa relação pode causar uma grande dependência ("ele me ama... ele não me ama... ele me ama..."). (p. 192)
Tenha autoconfiança: fale em tom calmo e baixo, mas com voz firme. Mantenha a cabeça erguida, diga o que precisa dizer e, em seguida, simplesmente desligue-se da situação - saia da sala, leve o cachorro para passear, vá fazer compras. Não perca seu tempo. Quanto mais você levar isso adiante e andar em círculos, mais desorientada se tornará e maior será a probabilidade de ser enrolada por ele. Se você não fraquejar, é bastante provável que ele lhe faça o grande favor de ir embora. (p. 194)
Antes do início das filmagens, Tony tem uma reunião com o diretor, os editores e os cinegrafistas para discutir o roteiro. Esse pode ser um reality show, mas Tony esclarece que não vai deixar nada ao acaso. Cada participante desempenhará um "personagem", e o diretor vai providenciar para que eles sejam retratados dessa maneira. (O diretor está um pouco inseguro em relação a essa abordagem, mas é seu primeiro trabalho importante para a emissora - e ele não vai dizer não para nenhuma das sugestões de Tony). Tem uma periguete, uma vampe, uma ingênua, uma profissional de carreira, e assim por diante. Na verdade, Tony não conheceu nenhum dos participantes pessoalmente, mas assistiu às gravações dos testes. Além disso, ele sabe que poderá manipulá-los e fazer cortes sem grandes problemas para obter o que quer. (p. 203)
Os chiliques e as explosões temperamentais de Tony são características dos psicopatas. (p. 205)
Os pesquisadores concluíram que o comportamento dos agentes penitenciários e dos detentos foi causado pela situação, e não por um traço de sua personalidade. Isso indica que até mesmo as pessoas mais afáveis podiam se transformar em agentes penitenciários sádicos, dependendo das circunstâncias. (p. 208)
Os dados estatísticos apresentados a seguir foram selecionados pelo site www.pinkstinks.co.uk como parte da sua campanha de combate à obsessão da mídia por mulheres ricas, famosas e magras e, consequentemente, apresentadas à geração mais nova como modelos de comportamento:
- Trinta e cinco por cento das meninas elegeram Vistoria Beckham como a celebridade de maior influência, seguida por Leona Lewis, em 32%, e Kate Moss e Amy Winehouse em terceiro e quarto lugares.
- Trinta e sete por cento dos professores disseram que os alunos queriam ser famosos apenas para serem famosos.
- Mais de 70% dos professores achavam que a cultura da celebridade está pervertendo as aspirações e expectativas das crianças e produzindo uma geração que não acredita que seja preciso estudar e trabalhar com afinco para obter sucesso financeiro.
- Quarenta e quatro por cento disse que os alunos tentavam imitar o visual e o comportamento de seus ídolos, sendo que 32% se miravam em Paris Hilton. (p. 211)
A melhor maneira de se defender de um psicopata é analisando constantemente os próprios valores: se alguém estiver tentando convencer você a se desviar de seus princípios ou até mesmo a transgredi-los, então ele não é a pessoa certa para fazer parte da sua vida. (p. 214)
A boa-nova é que, por definição, se você acha que é psicopata, é praticamente certo que não seja. No entanto, há momentos na vida de todos nós em que somos levados a ter um comportamento psicopata, a nos tornar o que chamamos de "psicopata situacional". (p. 215)
Mas para ser um psicopata de verdade é preciso ter traços psicopáticos permanentes que se manifestem em todas as ocasiões e em todos os contextos. O comportamento psicopata não é desencadeado por um acontecimento em particular, e os psicopatas não ficam pesarosos nem envergonhados pelos atos que praticaram. (p. 215)
A palavra psicopata virou chavão para qualquer comportamento agressivo ou bizarro que não compreendemos. Quem entre nós nunca comentou sobre um "chefe psicopata" ou um "ex que era psicopata"? (p. 218)
Mas como é ser um psicopata de verdade? Será que eles se importam de ser chamados assim? Conheci alguns que estavam muito felizes com o rótulo, orgulhosos por serem, de certa maneira, um tanto "especiais". (p. 218)
A boa notícia para todos os que convivem com psicopatas é que as condutas mais contraventoras e agressivas deles tendem a diminuir por volta dos 40 anos de idade. A boa notícia para eles é que, embora não sejam o que poderíamos chamar de criaturas felizes, eles não costumam sofrer de ansiedade nem de depressão. (p. 219)
Os psicopatas não fazem nenhuma ligação entre os próprios atos e suas consequências; eles não têm a menor capacidade de assumir responsabilidades. Mais do que isso, tudo de ruim que lhes acontece é visto como "má sorte". Os psicopatas, portanto, muitas vezes sentem-se desgostosos consigo mesmos. (p. 221)
A manipulação é a arte de sobrevivência dos psicopatas; portanto, não admira nem um pouco que eles sejam bastante talentosos nessa arte. (p. 223)
Tanto o autismo como a psicopatia foram associados a anormalidades no funcionamento do corpo amigdaloide, ou amígdala. Corpo amigdaloide é uma estrutura em forma de amêndoa, com cerca de 2,5 centímetros de comprimento, localizada no lobo temporal, próximo a cada orelha. Apesar de pequena, é "importantíssima na regulação das emoções e nos comportamentos regulados pelas emoções". Algumas de suas funções são ajudar a aprender com as consequências dos próprios ato e a reconhecer expressões faciais. Mas, embora a mesma área do cérebro seja afetada tanto nos autistas como nos psicopatas, o tipo de comprometimento parece ser muito diferente. (p. 225)
Hervey Cluckley notou "ausência de nervosismo" nos psicopatas que ele estudou. De modo geral, os psicopatas têm níveis reduzidos de ansiedade, sobretudo aqueles que apresentam mais traços de personalidade psicopática - o tipo que está sendo bastante analisado neste livro - do que características de estilo de vida. (p. 226)
Os psicopatas têm uma probabilidade muito maior de preencher os critérios diagnósticos de dependência de álcool e drogas (principalmente no caso de uso de vários tipos de drogas). (p. 226)
Se você leu este livro e ficou preocupado com a possibilidade de ser psicopata, a boa notícia é que provavelmente você não é. Um verdadeiro psicopata certamente não se reconheceria assim - pois ele não se consideram "maus", e, mesmo que se considerassem, não ficariam preocupados com isso. (p. 231)
Se você for um psicopata, talvez tenha a sorte de ter obtido sucesso na vida. Sem um ponto de referência moral, você será impiedoso na sua busca por recompensa e prazer. O psicopata tem menos tendência a ter depressão e a sentir ansiedade e certamente não se preocupa com o sentimento dos outros. Isso garante uma existência comparativamente livre de stress. O único consolo para as outras pessoas é que eles começam a "amolecer" um pouquinho na meia-idade.
Por outro lado, o psicopata tem uma vida pouco estável e, por causa das constantes brigas e rixas com as pessoas que convivem com ele, pode sentir-se "azarado" e perseguido. Os psicopatas também sabotam a si próprios, e qualquer equilíbrio alcançado será rapidamente rompido. Incapaz de se adaptar às normas sociais, um psicopata razoavelmente perceptivo pode se sentir "diferente" e injustamente colocado de lado pelos que o rodeiam. Embora você possa invejar um psicopata bem-sucedido por, digamos, sua grande determinação de obter sucesso financeiro, talvez sirva de consolo saber que ele jamais sentirá uma felicidade plena, mesmo que esteja coberto de ouro. (p. 232)
- Mas como saberei que você não vai me picar? - perguntou a rã desconfiada.
- É lógico que não vou fazer isso - respondeu o escorpião. - Se eu pocá-la, também morrerei.
Satisfeita, a rã concordou, e o escorpião subiu em suas costas.
Na metade da travessia, o escorpião deu uma ferroada na rã, condenando ambos à morte.
- Por que você fez isso? - gritou a rã moribunda.
- Porque essa é minha natureza - respondeu o escorpião. (p. 11)
Os cientistas calculam que entre 1% e 3% da população em geral seja psicopata. Portanto, se você tem cem amigos do Facebook, pelo menos um deles pode ser um psicopata (a menos que todas as suas amizades sejam da prisão; nesse caso, a porcentagem sobe para 15%). (p. 14)
A única coisa que os psicopatas têm em comum é uma série de problemas emocionais e comportamentos antissociais capazes de causar um grande estrago em famílias, organizações e comunidades inteiras. Esse é um quadro resistente ao tratamento. Destituídos de qualquer empatia, eles tentam obter aquilo que querem sem se importar com quem atravessa o seu caminho. Com charme, manipulação e muita habilidade, eles seguem em direção a sua carreira, sua casa - e até mesmo seu coração. (p. 15)
Não tenha nenhuma dúvida: se houver um possível psicopata na sua vida, você precisará escapar dele rapidamente. (p. 16)
Conheci alguns dos criminosos psicopatas mais famosos do país. E sei como alguns deles podem ser manipuladores, charmosos e inteligentes. (p. 16)
Como querem causar uma boa impressão, os psicopatas costumam demonstrar uma falsa preocupação com o bem-estar do entrevistador. (p. 17)
Atualmente, o padrão internacional para avaliação e diagnóstico de psicopatia é a escala PCL-R (lista de verificação de psicopatia - Psychopathy Checklist Revised), criada pelo dr. Robert Hare em 1991. Trata-se de um instrumento extensamente pesquisado que mede o grau em que uma pessoa demonstra as vinte qualidades fundamentais de um psicopata. A avaliação por meio da escala PCL-R é complexa e tem de ser feita por um psicólogo devidamente qualificado e altamente treinado. (p. 20)
Na prática, a escala PCL-R agrupa as características que definem um psicopata de acordo com dois fatores amplos: traços de personalidade e estilo de vida desviante. Para ser um psicopata é preciso ter evidências tanto de características de personalidade como de estilo de vida, embora cada pessoa tenha uma combinação diferente. (p. 22)
Os psicopatas são incapazes de qualquer sutileza ou emoção profunda; seus sentimentos geralmente não passam de reações primitivas passageiras às suas vontades e necessidades imediatas. Portanto, eles também não têm capacidade de compreender os sentimentos alheios; são indiferentes aos direitos ou ao bem-estar das outras pessoas, que consideram meros objetos a serem manipulados a seu bel-prazer. o entanto, o psicopata é capaz de ocultar sua natureza fria e predatória por trás de um charme cativante. (p. 22)
Os psicopatas acham que têm o direito de ter tudo o que querem, não importa a que preço, e costumam ter explosões violentas e descontroladas quando são criticados ou frustrados. Assim como o escorpião da fábula, faz parte da natureza deles usar e prejudicar os outros, embora muitas vezes acabem inadvertidamente dando um tiro no próprio pé. Apesar de jamais admitirem, os psicopatas culpam a tudo e a todos - mas nunca a si mesmos - por seus problemas. (p. 22)
Psicopatas e narcisistas podem ser convenientemente considerados primos de primeiro grau. (p. 24)
Há um grupo distinto - às vezes, formado por indivíduos denominados psicopatas "bem-sucedidos" ou "sub-clínicos" - que não trilha o caminho óbvio do crime. Talvez sejam particularmente inteligentes ou cultos, menos fortuitos do que o psicopata típico, talvez tenham desenvolvido habilidades sociais altamente refinadas e conseguido se inserir em um setor da sociedade em que foram aceitos e conquistaram confiança - por exemplo, um advogado, um corretor e valores ou até mesmo um psiquiatra. Outros psicopatas aperam nos limites da lei: sua conduta pode não ser ilegal - não exatamente -, mas é imoral e possivelmente devastadora para aqueles que têm a infelicidade de se envolver com eles. Outros simplesmente ainda não foram apanhados e conseguem, com bastante sagacidade, manipular, intimidar ou aterrorizar a família, os amigos, os colegas e os sócios, fazendo com que se calem diante de sua má conduta. (p. 27)
A American Psychiatric Association [Associação Americana de Psiquiatria] calcula que aproximadamente 3% dos homens e 1% das mulheres na população em geral sejam psicopatas. (p. 30)
Definitivamente, não, psicopatia não tem "cura", e os programas genéricos para tratamento de criminosos não surtem efeito nos psicopatas. (p. 30)
Embora os estudos não identifiquem que os psicopatas tenham alguma lesão cerebral, seu cérebro realmente parece ser diferente do das outras pessoas. Por exemplo, técnicas de neuroimagem revelaram que, quando os psicopatas são solicitados a realizar tarefas que requerem o processamento de palavras carregadas de emoção, as partes do seu cérebro que são ativadas não são as mesmas dos grupos de controle normais. (p. 31)
De vez em quando você ouvirá as pessoas falarem de "sociopatas", além de psicopatas, mas na verdade não existe diferença entre os dois termos: ambos são usados omo sinônimos. Grosso modo, o termo sociopata é mais um americanismo, de modo que um psicopata pode virar sociopata ao cruzar o Atlântico. (p. 31)
Há mais narcisistas no mundo dos negócios do que na população carcerária. (p. 36)
A sedução é apenas outra arma que o psicopata usa para obter poder, e a regra "é proibido relacionamento amoroso entre colegas de trabalho" não será sequer considerada. Ele considera o sexo com seus subordinados uma das vantagens do trabalho. (p. 41)
Os psicopatas não têm ética empresarial - eles não entendem o que quer dizer trabalhar "para o bem da empresa", e você nunca vai ouvi-los dizer que não existe "eu" em equipe. Eles simplesmente acham que lealdade é coisa de "perdedor". (p. 43)
Você já ouviu a expressão "Ele venderia a própria mãe..."? Essa é a atitude do psicopata superambicioso. Ele não sente culpa nem remorso nem vergonha. Se um psicopata parece ser leal a alguém, é só porque ele sabe que essa pessoa poderá ser útil a longo prazo. (p. 63)
Os psicopatas não cedem diante da adversidade. Mas o que parece coragem estoica ou imunidade ao fracasso não passa de incapacidade de aprender com a punição e, consequentemente, modificar seu comportamento. (p. 64)
Ao que parece, muitas das qualidades apreciadas em um empreendedor de sucesso são extraordinariamente semelhantes a muitas das características de um psicopata: autoconfiança delirante, autoritarismo arrogante, busca implacável por dinheiro, capacidade de vender a própria mãe e absoluta despreocupação em relação ao fracasso. (p. 72)
Para escolher seu alvo, os psicopatas têm um truque na manga. Eles são grandes mímicos e, às vezes, imitam o jeito de falar (ritmo da fala, uso específico de alguns termos, etc.) e os gestos de uma pessoa. Isso por si só já cria um clima favorável: somos inconscientemente levados a nos sentir mais à vontade e a gostar de alguém que pareça estar em "sintonia" conosco. (p. 79)
Todos os relacionamentos dos psicopatas estão ligados à exploração - eles sempre usam outra pessoa para realizar seus desejos. (p. 80)
Os psicopatas fazem mais gestos casuais com as mãos (conhecidos como "batidas") do que os que não são psicopatas, particularmente quando falam de assuntos sentimentais ou interpessoais, como descrições de relações familiares e do início da vida familiar. Os psicólogos acreditam que isso seja um sinal do grande esforço cognitivo que eles precisam fazer para discutir sentimentos e conceitos que, para eles, são abstratos. (Pense no movimento que você faz com as mãos quando está tentando se lembrar de uma palavra.) Psicopatas criminosos fazem menos gestos com as mãos quando falam sobre os crimes que cometeram, uma vez que conhecem bem essa situação, que tem mais significado para eles. (p. 83)
Os psicopatas não têm sentimentos relativos a laços familiares, sejam deles ou de outras pessoas. Para eles, seus pretensos amigos mais próximos e queridos nada mais são do que recursos adicionais a serem sugados. (p. 85)
Sem nenhuma consideração pelos planos alheios e sem pesar as consequências, o psicopata só faz o que quer e quando quer. (p. 85)
Os psicopatas normalmente são descritos como alguém que tem "o dom da palavra", mas é o seu jeito de falar que atrai a nossa atenção, e não o seu uso eloquente das palavras. Na verdade, os especialistas observaram que a linguagem usada pelo psicopata tem características peculiares e desajeitadas que podem passar despercebidas ao ouvinte mais desavisado. (p. 87)
Os psicopatas parecem juntar as palavras de forma estranha - cometem lapsos linguísticos ou malapropismos. (p. 87)
Hare diz que é "como se os psicopatas tivessem dificuldade de controlar a própria fala", permitindo, assim, fluxos complicados e mal organizados de palavras e pensamentos. (p. 87)
Pode ser que o estilo idiossincrático do psicopata seja produto de um cérebro atipicamente "lateralizado". Na maioria das pessoas, o hemisfério esquerdo do cérebro tem o controle primário sobre a maneira como as palavras são usadas e compreendidas. Mas há indícios de que, nos psicopatas, os centros de linguagem sejam bilaterais - quer dizer: estão localizados em ambos os hemisférios. Isso significa que as informações verbais têm de passar pelos dois hemisférios e podem, portanto, tornar-se mais facilmente desordenadas. (p. 88)
A psicóloga Debra Oswald, Ph.D. pela Marquette University, em Milwaukee, Estados Unidos, diz que os laços de amizade precisam de quatro pilares para se manter: confidência e apoio constantes (ambos necessários para criar intimidade), interação (telefonemas, e-mails ou visita aos amigos) e positividade (uma amizade gratificante nos motiva a mantê-la viva). Para acabar com uma amizade prejudicial é preciso deixar de fazer essas quatro coisas. Um psicopata terá dificuldade de seduzi-lo se você não lhe der informações íntimas, não lhe telefonar e não apoiar seus planos ou desejos. (p. 93)
O olhar fixo e penetrante de um psicopata pode ser muito sedutor. Até mesmo um encontro casual e descompromissado com um psicopata pode ser difícil: eles têm tendência para expressar rapidamente emoções profundas - e se você estiver procurando alguém para amar, essa pode ser a isca perfeita para fisgar você. (p. 94)
Com o aumento crescente do número de encontros marcados pela Internet nos últimos anos, nunca foi tão importante ficar atento em relação à pessoa com quem exatamente estamos planejando dividir uma garrafa de vinho. Um psicopata pode esconder facilmente sua verdadeira personalidade por trás de uma tela de computador. Mentirosos prolíficos, eles dizem exatamente aquilo que você quer ouvir para obter aquilo que querem. (p. 95)
Se for usar um site de namoro, use um que seja conhecido, que os membros precisem pagar para se inscrever; ele protegerá seus dados pessoais e terá medidas contra uso inapropriado. Veja se você pode "bloquear" pessoas quando não quiser saber delas.
Observe as regras usuais de segurança - marque encontro em um local público, informe a uma amiga para onde você está indo, tome as providências necessárias para ir e voltar sozinha, leve o celular carregado, não fique bêbada nem tire os olhos do seu copo de bebida.
Desconfie de uma pessoa que sofre de Síndrome de Excesso de Informação, principalmente se ela lhe contar uma história de arrancar lágrimas ou histórias implausíveis sobre seu heroísmo. (p. 113)
Existem duas fases no desenvolvimento emocional da criança em que se espera que "traços de psicopatia" apareçam, pelo menos até certo ponto. De 2 a 3 anos de idade, as crianças estão começando a desenvolver suas habilidades mentais de raciocínio, mas ainda são muito egocêntricas e não conseguem distinguir direito a fantasia da realidade. (p. 117)
A segunda fase de "psicopatia do desenvolvimento" é a adolescência. Os psicólogos evolucionistas descrevem esse período como um período de "tempestade e stress". É um momento em que os hormônios, o corpo em transformação e o aumento dos níveis de responsabilidade conspiram para transformar crianças, que antes eram umas gracinhas, em diabinhos beligerantes, rabugentos e inflexíveis. (p. 117)
Os neurocientistas acreditam que, assim como o cérebro das crianças é "moldado" nos primeiros anos de vida, durante a adolescência também ocorrem algumas reestruturações fundamentais.
Os lobos frontais e parietais, especificamente relacionados com autocontrole, apresentam um crescimento repentino entre 10 e 12 anos. A esse crescimento segue-se uma drástica redução das conexões sinápticas durante a adolescência. (p. 118)
A opinião de Hare é que "a psicopatia é resultado de uma complexa - e mal compreendida - interação entre fatores biológicos e forças sociais". (p. 119)
Os psicopatas são criaturas que busca, estímulos, e o abuso de drogas é comum em psicopatas adolescentes, pois essa é uma forma barata e acessível de atender às suas necessidades de estimulação. (p. 124)
Os sinais mais preocupantes que poderiam indicar um comportamento psicopata são: roubas coisas de outras crianças e dos pais; praticar atos de vandalismo; provocar incêndio; ferir ou matar animais; praticar bullying; ter experiência sexual precoce e extrema, principalmente envolvendo coação de outras crianças; ausentar-se de casa e matar aulas sem dar explicação; não responder a repreensões e castigos. Lembre-se de que os psicopatas exibem um conjunto de comportamentos, portanto, não entre em pânico com um ou dois incidentes isolados. (p. 132)
Estudos mostram uma elevada "comorbidade" entre tendências psicopatas e Transtornos de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), ou seja, eles frequentemente ocorrem juntos. Além disso, o TDAH pode ser encontrado em até 75% dos casos de crianças psicopatas. (p. 133)
Não há nenhuma ligação conclusiva entre videogames violentos e violência grave em crianças ou adultos, mas é possível que eles aumentem o nosso "limiar de violência" ao nos tornar insensíveis a atos extremos e nos recompensar por eles - afinal, esses jogos recompensam atos como assassinato. (p. 135)
O comportamento violento se desenvolve progressivamente, por isso, cabe aos adultos próximos à criança monitorar sinais observáveis no processo evolutivo da agressão. (p. 138)
Destituídos de qualquer sentimento de empatia, os pais psicopatas costumam cuidar dos filhos de forma mecânica. É como se os filhos fossem bonecos; eles são incapazes de compreender as necessidades do bebê e, portanto, ignoram seu choro ou sua fralda suja. A criança pode até mesmo ser vista como uma mera mercadoria. (p. 151)
De acordo com inúmeros estudos e pesquisas, particularmente aqueles que envolvem tomografias cerebrais, existem fortes indícios de que a psicopatia seja uma condição genética. No mínimo, existe uma predisposição genética que pode conduzir determinada pessoa ao ambiente certo (ou melhor, errado) para o desenvolvimento de psicopatia. (p. 159)
Especialistas em psicologia evolutiva propuseram a teoria de que a psicopatia é uma estratégia reprodutiva viável. Harris e Rice ressaltaram que muitas características do psicopata - busca de sensações e propensão à violência - teriam sico úteis para impressionar o sexo oposto na época dos homens da caverna e poderiam, portanto, ser uma forma de a Mãe Natureza garantir a geração seguinte.
Os psicopatas geralmente são promíscuos e infiéis; para Hate, provavelmente a consequência desse comportamento é o fato de os psicopatas - tanto do sexo masculino como do feminino - terem muitos e muitos filhos, embora seja pouco provável que cuidem muito bem deles (se realmente participarem da vida deles). (p. 165)
O argumento contra essa teoria é que a propensão dos psicopatas a correr riscos não se encaixa nesse perfil; não é fácil passar adiante seus genes quando você está constantemente arriscando sua vida, como fazem muitos psicopatas (consumindo drogas, dirigindo em alta velocidade, etc.). (p. 166)
Lembre-se de que alguém que o maltrata não merece fazer parte da sua vida, mesmo que sejam seus pais. Não se sinta na obrigação de lhes dar dinheiro ou um lugar na sua casa. Se você já tem sua própria família, faça dela a sua prioridade. (p. 167)
O que confunde é que os psicopatas conseguem tapear muito bem suas vítimas se fazendo de carinhosos. Quando são inteligentes, eles aprendem os comportamentos sociais certos para enganar a maioria das pessoas a maior parte do tempo. Quando um psicopata quer desviar sua atenção de algo que revele sua verdadeira natureza, ele diz que ama você. mas é óbvio que ele não sente amor. (p. 173)
Os psicopatas frequentemente adotam um estilo de romance do tipo "água com açúcar" - chocolates, flores, poesia. (p. 174)
Nos casos mais graves, o psicopata pode manipular sua parceira reagindo às suas queixas com maus-tratos a alguém ou algo que signifique muito para ela - classicamente, animais de estimação ou crianças. (p. 175)
Pornografia, prostituição ou, mais comumente, lenocínio é comum entre psicopatas. (p. 177)
Compromisso não é um conceito que os psicopatas entendam, mas eles têm consciência de todas as vantagens financeiras, além de outras, que viver com um parceiro pode trazer. (p. 179)
Em alguns estudos, crianças e adultos que exibiam tendências psicopatas foram solicitados a ouvir uma gravação de vozes e a descrever a emoção contida nessas vozes, mas tiveram dificuldade em fazê-lo. Um resultado semelhante foi observado num estudo em que psicopatas foram solicitados a identificar a emoção expressa no rosto de outras pessoas e eles se mostraram insensíveis a sentimentos de medo, aversão e tristeza. Os pesquisadores descobriram também que, diante de um rosto com expressão neutra e que lentamente se transformava em expressão de medo, os psicopatas levaram um tempo significativamente maior para identificar a emoção do que os não psicopatas. Eles precisaram de 75% da expressão para poder detectar o medo, e os que não eram psicopatas precisaram de 65% da expressão. (p. 186)
Assim como em qualquer outra área de manipulação ou fraude, um psicopata em busca de uma parceira escolhe sua vítima com cuidado. Ele escolhe uma mulher solitária e vulnerável, ou muito bem-sucedida, que possa lhe dar o status que deseja. Hábil manipulador, ele usa uma série de recompensas e ameaças para conseguir exatamente o que quer de sua vítima. Finalmente, quando consegue, ele a abandona, deixando-a perplexa e confusa. Em geral, ele volta várias vezes. O relacionamento com um psicopata pode ser verdadeiramente devastador. Mas entendo que a dinâmica dessa relação pode causar uma grande dependência ("ele me ama... ele não me ama... ele me ama..."). (p. 192)
Tenha autoconfiança: fale em tom calmo e baixo, mas com voz firme. Mantenha a cabeça erguida, diga o que precisa dizer e, em seguida, simplesmente desligue-se da situação - saia da sala, leve o cachorro para passear, vá fazer compras. Não perca seu tempo. Quanto mais você levar isso adiante e andar em círculos, mais desorientada se tornará e maior será a probabilidade de ser enrolada por ele. Se você não fraquejar, é bastante provável que ele lhe faça o grande favor de ir embora. (p. 194)
Antes do início das filmagens, Tony tem uma reunião com o diretor, os editores e os cinegrafistas para discutir o roteiro. Esse pode ser um reality show, mas Tony esclarece que não vai deixar nada ao acaso. Cada participante desempenhará um "personagem", e o diretor vai providenciar para que eles sejam retratados dessa maneira. (O diretor está um pouco inseguro em relação a essa abordagem, mas é seu primeiro trabalho importante para a emissora - e ele não vai dizer não para nenhuma das sugestões de Tony). Tem uma periguete, uma vampe, uma ingênua, uma profissional de carreira, e assim por diante. Na verdade, Tony não conheceu nenhum dos participantes pessoalmente, mas assistiu às gravações dos testes. Além disso, ele sabe que poderá manipulá-los e fazer cortes sem grandes problemas para obter o que quer. (p. 203)
Os chiliques e as explosões temperamentais de Tony são características dos psicopatas. (p. 205)
Os pesquisadores concluíram que o comportamento dos agentes penitenciários e dos detentos foi causado pela situação, e não por um traço de sua personalidade. Isso indica que até mesmo as pessoas mais afáveis podiam se transformar em agentes penitenciários sádicos, dependendo das circunstâncias. (p. 208)
Os dados estatísticos apresentados a seguir foram selecionados pelo site www.pinkstinks.co.uk como parte da sua campanha de combate à obsessão da mídia por mulheres ricas, famosas e magras e, consequentemente, apresentadas à geração mais nova como modelos de comportamento:
- Trinta e cinco por cento das meninas elegeram Vistoria Beckham como a celebridade de maior influência, seguida por Leona Lewis, em 32%, e Kate Moss e Amy Winehouse em terceiro e quarto lugares.
- Trinta e sete por cento dos professores disseram que os alunos queriam ser famosos apenas para serem famosos.
- Mais de 70% dos professores achavam que a cultura da celebridade está pervertendo as aspirações e expectativas das crianças e produzindo uma geração que não acredita que seja preciso estudar e trabalhar com afinco para obter sucesso financeiro.
- Quarenta e quatro por cento disse que os alunos tentavam imitar o visual e o comportamento de seus ídolos, sendo que 32% se miravam em Paris Hilton. (p. 211)
A melhor maneira de se defender de um psicopata é analisando constantemente os próprios valores: se alguém estiver tentando convencer você a se desviar de seus princípios ou até mesmo a transgredi-los, então ele não é a pessoa certa para fazer parte da sua vida. (p. 214)
A boa-nova é que, por definição, se você acha que é psicopata, é praticamente certo que não seja. No entanto, há momentos na vida de todos nós em que somos levados a ter um comportamento psicopata, a nos tornar o que chamamos de "psicopata situacional". (p. 215)
Mas para ser um psicopata de verdade é preciso ter traços psicopáticos permanentes que se manifestem em todas as ocasiões e em todos os contextos. O comportamento psicopata não é desencadeado por um acontecimento em particular, e os psicopatas não ficam pesarosos nem envergonhados pelos atos que praticaram. (p. 215)
A palavra psicopata virou chavão para qualquer comportamento agressivo ou bizarro que não compreendemos. Quem entre nós nunca comentou sobre um "chefe psicopata" ou um "ex que era psicopata"? (p. 218)
Mas como é ser um psicopata de verdade? Será que eles se importam de ser chamados assim? Conheci alguns que estavam muito felizes com o rótulo, orgulhosos por serem, de certa maneira, um tanto "especiais". (p. 218)
A boa notícia para todos os que convivem com psicopatas é que as condutas mais contraventoras e agressivas deles tendem a diminuir por volta dos 40 anos de idade. A boa notícia para eles é que, embora não sejam o que poderíamos chamar de criaturas felizes, eles não costumam sofrer de ansiedade nem de depressão. (p. 219)
Os psicopatas não fazem nenhuma ligação entre os próprios atos e suas consequências; eles não têm a menor capacidade de assumir responsabilidades. Mais do que isso, tudo de ruim que lhes acontece é visto como "má sorte". Os psicopatas, portanto, muitas vezes sentem-se desgostosos consigo mesmos. (p. 221)
A manipulação é a arte de sobrevivência dos psicopatas; portanto, não admira nem um pouco que eles sejam bastante talentosos nessa arte. (p. 223)
Tanto o autismo como a psicopatia foram associados a anormalidades no funcionamento do corpo amigdaloide, ou amígdala. Corpo amigdaloide é uma estrutura em forma de amêndoa, com cerca de 2,5 centímetros de comprimento, localizada no lobo temporal, próximo a cada orelha. Apesar de pequena, é "importantíssima na regulação das emoções e nos comportamentos regulados pelas emoções". Algumas de suas funções são ajudar a aprender com as consequências dos próprios ato e a reconhecer expressões faciais. Mas, embora a mesma área do cérebro seja afetada tanto nos autistas como nos psicopatas, o tipo de comprometimento parece ser muito diferente. (p. 225)
Hervey Cluckley notou "ausência de nervosismo" nos psicopatas que ele estudou. De modo geral, os psicopatas têm níveis reduzidos de ansiedade, sobretudo aqueles que apresentam mais traços de personalidade psicopática - o tipo que está sendo bastante analisado neste livro - do que características de estilo de vida. (p. 226)
Os psicopatas têm uma probabilidade muito maior de preencher os critérios diagnósticos de dependência de álcool e drogas (principalmente no caso de uso de vários tipos de drogas). (p. 226)
Se você leu este livro e ficou preocupado com a possibilidade de ser psicopata, a boa notícia é que provavelmente você não é. Um verdadeiro psicopata certamente não se reconheceria assim - pois ele não se consideram "maus", e, mesmo que se considerassem, não ficariam preocupados com isso. (p. 231)
Se você for um psicopata, talvez tenha a sorte de ter obtido sucesso na vida. Sem um ponto de referência moral, você será impiedoso na sua busca por recompensa e prazer. O psicopata tem menos tendência a ter depressão e a sentir ansiedade e certamente não se preocupa com o sentimento dos outros. Isso garante uma existência comparativamente livre de stress. O único consolo para as outras pessoas é que eles começam a "amolecer" um pouquinho na meia-idade.
Por outro lado, o psicopata tem uma vida pouco estável e, por causa das constantes brigas e rixas com as pessoas que convivem com ele, pode sentir-se "azarado" e perseguido. Os psicopatas também sabotam a si próprios, e qualquer equilíbrio alcançado será rapidamente rompido. Incapaz de se adaptar às normas sociais, um psicopata razoavelmente perceptivo pode se sentir "diferente" e injustamente colocado de lado pelos que o rodeiam. Embora você possa invejar um psicopata bem-sucedido por, digamos, sua grande determinação de obter sucesso financeiro, talvez sirva de consolo saber que ele jamais sentirá uma felicidade plena, mesmo que esteja coberto de ouro. (p. 232)
Assinar:
Postagens (Atom)